OS QUE CHORAM PARA DENTRO
Mesmo não sendo paroquiano da igreja São Judas Tadeu, tampouco católico, acompanho as notícias da transferência de Padre Chiquinho com um aperto no coração. Por determinação do bispo diocesano, dom Tarcísio Scaramussa, o querido pároco deixará, depois de 48 anos, a igreja do Marapé.
De baixa estatura, o que lhe rendeu o terno apelido, mas um gigante moralmente, monsenhor Francisco das Dores recebe com carinho as manifestações dos fiéis para que permaneça na igreja, que vão de abaixo-assinado ao bispo, a promessas ao santo das causas impossíveis. Padre Chiquinho, no íntimo, entende que a vida é feita de missões e que a sua, ali, acabou.
Depois de tantas missas, eis mais uma preciosa lição, as mudanças são necessárias, temos que nos adaptar a elas. A vida de todos nós é repleta dessas mudanças, às vezes pequenas, às vezes enormes, como quando nos descobrimos com alguma grave doença, ou quando perdemos alguém muito próximo e querido.
As mudanças não dependem de nós, como a do padre e milhões de outras, elas nos chegam e, dependendo de nosso grau de maturidade, podem nos arrasar, ou nos tornar mais fortes, isso procede de como nos relacionamos com elas.
Uma mudança de emprego, por exemplo, pode ser uma grande oportunidade ou uma catástrofe total. Em geral, ficamos inseguros em encarar o novo, em sair de nossa zona de conforto e alçar novos voos. Muitos se desesperam.
Conheci, certa vez, um rapaz, meu vizinho, que desempregado, angustiado com as contas que não paravam de chegar, desiludido de tantos currículos entregues sem nenhuma resposta, acabou optando pelo suicídio. Acho mesmo que não nos conhecemos até vivenciarmos situações extremas, como a que ele enfrentou, mas não o culpo pela precipitação, mesmo alguns familiares relatando que dias após a fatalidade houve o contato de uma empresa para contratá-lo.
As mudanças são imprescindíveis em nossas vidas, simplesmente porque elas nos mudam. Fazem com que enxerguemos às coisas de outro viés. Elliot Gould, ator norte-americano, afirma que “ninguém pode ser escravo de sua identidade: quando surge uma possibilidade de mudança é preciso mudar”. Isso não quer dizer ser volúvel, mas estar aberto ao novo, entender que transformações não são, necessariamente, distorções. Quantas pessoas conhecemos que adoram citar a cansativa frase ”no meu tempo...”? Nosso tempo é agora.
Não que o friozinho na barriga seja proibido, ao contrário, temos que experimentar essas sensações inerentes às mudanças. A saudade das pessoas, a lembrança de algum cheiro, aquele jardim que ficou para trás. Padre Chiquinho, aos 86 anos, é um menino que entende tudo isso e que com um belo sorriso no rosto e sem nenhum melindre, nos ensina: “Há pessoas que choram para dentro”.