CORONADA - XII
Manhã de 7 de abril. 7:14h. Aqui, todo mundo ainda dorme o sono intranquilo dos tempos pandêmicos. Desço para ver o Bono, trocar sua água e repor a comida. Em cima da da máquina um exemplar do caderno Paladar/Divirta-se/Casa/Viagem, do Estadão. Olho a data: 13 de março, quase um mês atrás. Vou ao banheiro meditar. Levo o pequeno calhamaço comigo.
Folheio o que era o mundo antes desse apocalipse. Uma eleição das melhores cachaças nacionais, grupos e expedições que ensinam a reconhecer e colher cogumelos, uma megaexposição sobre Lennon com fotos de Bob Gruen no MIS, uma matéria com a maior piscina do mundo, de 1km de extensão, no Chile. Dicas de shows, cinema, gastronomia. Um pequeno roteiro indica como remarcar viagens por conta do coronavírus.
Tudo clean, simples, ordenado, como naturalmente são as coisas previsíveis, sem alma, sem jazz. Nada que indicasse que estávamos às vésperas do hecatombe.
Que os jornais, revistas, as notícias no futuro enfim, venham sem tanto verniz, tragam mais a sístole e diástole da vida real, menos limpa e com mais sangue. Como sempre foi, aliás, e nós insistimos em acreditar em discursos que sempre repetiam que o branco da bandeira e da pomba não estavam encardidos.