Organização do último evento
Tornou-se inevitável o tema, diante da situação mundial, a morte passa a ser assunto corriqueiro, e mesmo tendo fugido de seus acertos, é chegado o momento de rever conceitos e organizar com esmero aquele que seria o último evento, que estaria, obrigatoriamente, de corpo presente.
Foram semanas acompanhando noticiários, a visão de caixões amontoados se repetia a cada volta por todos os canais disponíveis, seja livre ou pago, o medo de começar a se adaptar à situação provocou o desligamento total dos fatos e do aparelho que tentava obrigar a enxergar a morte como algo banal.
Qual o nome do corpo depositado na urna de número 284957?
Que histórias viveu, influenciou e transformou enquanto caminhava e respirava?
Qual a sua participação produtiva e como retroalimentava o sistema produtivo que o engoliu e o tornou esse número de ordem a ser armazenado em arquivo literalmente morto?
Perguntas sem respostas diante do retrato do caos, da emergência em catalogar as próximas baixas e numerar urnas desumanizadas, sem história, choros e velório.
Foi o start, precisava organizar o seu evento, uma pesquisa rápida nas redes sociais e encontrou um site que oferecia café e alimentação, mas talvez o público desejado não fosse exatamente aquele atraído por cafezinho e pão de queijo, feito reuniões corporativas tediosas, elaboradas com alegação de buscar soluções, quando na verdade, não ousam ouvir e além de comes e bebes, oferecem como chamariz para a lotação e demonstração de interesse, algum tipo de brinde ou mero sorteio, e não, não é esta a imagem que planejava imprimir em sua despedida.
Começou a relacionar as vozes que deveriam ser ouvidas e reverenciadas, Luiz Melodia, Elza Soares, Emílio Santiago e algumas interpretações de Maria Bethânia; pensou nas cores e imaginou um jardim em movimento, então as cores primárias precisariam prevalecer, vermelho, amarelo, feito um jardim ao vento, e poderiam cantar sem medo, mesmo em descompasso e desarmonia, pois sempre gostou da música bonita reproduzida por aqueles que a sentem, mesmo sem conhecer absolutamente nada de teoria, importante seria viver a letra intensamente.
Dançar seria permitido a todos que assim desejassem, seria lindo, só proibiria discursos, nunca gostou de falas dirigidas a quem não pode ouvir e sequer retrucar, quem a conheceu, certamente debateu algo e compreende o quanto abominava monólogos e suas apresentações de verdades absolutas, além de seres medrosos que dão as costas para não serem contrariados ou mesmo desmascarados em suas falas doentias, portanto, vivam a música, a poesia ali contida, façam suas preces em silêncio e se despeçam sem a necessidade de apresentar quem foi aquela depositada na urna.
Para todos aqueles que não se dispuseram a conhecer-me enquanto num gerúndio perfeito, quando estava acontecendo, vivendo, fazendo, não precisam penalizar-se por tamanha falha, desejo que sigam em frente, sem carregar o fardo da oportunidade perdida, acreditem na letra da canção e digam que fui por aí.
Foram semanas acompanhando noticiários, a visão de caixões amontoados se repetia a cada volta por todos os canais disponíveis, seja livre ou pago, o medo de começar a se adaptar à situação provocou o desligamento total dos fatos e do aparelho que tentava obrigar a enxergar a morte como algo banal.
Qual o nome do corpo depositado na urna de número 284957?
Que histórias viveu, influenciou e transformou enquanto caminhava e respirava?
Qual a sua participação produtiva e como retroalimentava o sistema produtivo que o engoliu e o tornou esse número de ordem a ser armazenado em arquivo literalmente morto?
Perguntas sem respostas diante do retrato do caos, da emergência em catalogar as próximas baixas e numerar urnas desumanizadas, sem história, choros e velório.
Foi o start, precisava organizar o seu evento, uma pesquisa rápida nas redes sociais e encontrou um site que oferecia café e alimentação, mas talvez o público desejado não fosse exatamente aquele atraído por cafezinho e pão de queijo, feito reuniões corporativas tediosas, elaboradas com alegação de buscar soluções, quando na verdade, não ousam ouvir e além de comes e bebes, oferecem como chamariz para a lotação e demonstração de interesse, algum tipo de brinde ou mero sorteio, e não, não é esta a imagem que planejava imprimir em sua despedida.
Começou a relacionar as vozes que deveriam ser ouvidas e reverenciadas, Luiz Melodia, Elza Soares, Emílio Santiago e algumas interpretações de Maria Bethânia; pensou nas cores e imaginou um jardim em movimento, então as cores primárias precisariam prevalecer, vermelho, amarelo, feito um jardim ao vento, e poderiam cantar sem medo, mesmo em descompasso e desarmonia, pois sempre gostou da música bonita reproduzida por aqueles que a sentem, mesmo sem conhecer absolutamente nada de teoria, importante seria viver a letra intensamente.
Dançar seria permitido a todos que assim desejassem, seria lindo, só proibiria discursos, nunca gostou de falas dirigidas a quem não pode ouvir e sequer retrucar, quem a conheceu, certamente debateu algo e compreende o quanto abominava monólogos e suas apresentações de verdades absolutas, além de seres medrosos que dão as costas para não serem contrariados ou mesmo desmascarados em suas falas doentias, portanto, vivam a música, a poesia ali contida, façam suas preces em silêncio e se despeçam sem a necessidade de apresentar quem foi aquela depositada na urna.
Para todos aqueles que não se dispuseram a conhecer-me enquanto num gerúndio perfeito, quando estava acontecendo, vivendo, fazendo, não precisam penalizar-se por tamanha falha, desejo que sigam em frente, sem carregar o fardo da oportunidade perdida, acreditem na letra da canção e digam que fui por aí.