EM TEMPOS DE QUARENTENA
Estamos acostumados com nossa frenética rotina diária de mil e uma obrigações. Hora certa para acordar, cumprir os compromissos do trabalho, da família, da casa e se tiver um tempinho, cuidar de si mesmo, tudo isto, sem a plena certeza de quando o “nosso” dia de 24 horas literalmente acaba. Reclamamos! Ansiamos de tempos em tempos por descanso. Mas, quando este de fato nos alcança, sentimo-nos vazios, angustiados e necessitados pelo tique-taquear de nossa louca vida cotidiana.
Infelizmente, o descanso que sobre nós se impõem neste momento de uma pandemia global, não é bem àquele tipo de “folga” que esperávamos, contudo, mesmo imposto em termos de quarentena, tem nos feito pausar boa parte de nossas atividades e nos permitido refletir um pouco sobre tudo.
O nosso home office como alternativa em tempos em que a tecnologia nos suporta para tal produção profissional, traz um certo alívio quanto a manutenção da nossa produtividade e necessidade por trabalho, utilidade humana e entrega de resultados esperados, seja para qual fim for. Independentemente, o ambiente de casa em nada se compara com o do escritório. Estamos diante de silêncios absolutos, pela ausência dos companheiros de sala, encontros despretensiosos, produtivos ou não pelos corredores da empresa ou atordoados pelo barulho das crianças enérgicas em meio a carência infinda por atenção e ocupação do seu tempo, de todo modo, ocioso.
Mas, estar em casa nos poupa em grande parte de um dos maiores estresses do dia: o trânsito! Ganhamos tempo pela desnecessidade de deslocamento. Também não precisamos nos preocupar com o “look” do dia e trabalhar de pijama e chinelos parece ser mais cômodo do que com um salto de 15 cm. Vantagens e desvantagens deste momento tão inesperado que sobre nós recaí. Este tempo livre te permite olhar mais próximo para tudo em volta de tua casa. De repente você percebe o que está pendente de uma boa arrumação, de coisas que já deveriam ter sido descartadas em uma boa faxina ou àquele item necessário que você vive dizendo que precisa comprar, mas nunca tem tempo para adquiri-lo. Tempo esse que agora temos de sobra.
Enquanto nos resta um pouco mais de tempo, nos falta algo que invisivelmente é um bem de grande valor: a nossa liberdade de ir e vir. Não estamos presos. Mas, estamos conscientemente em confinamento pelo bem comum. Nisto não há discussão. Contudo, o fato de querer e não poder, nos traz um completo sentimento de inutilidade. Quando e como imaginaríamos não poder se reunir com os amigos numa mesa de um restaurante? Ou comemorar o seu aniversário com a família? Ou comprar num shopping center itens que não são essenciais a sobrevivência, mas que são elementares para o nosso dia-a-dia, simplesmente porque a maior parte das portas estão fechadas?.
Afirmo que é inimaginável o que estamos encarando neste momento de crise. Muitas perguntas sem respostas, confinamento por tempo indeterminado, perdas lastimáveis, necessidades que afloram e limites que nos restringem. Isso me faz imaginar que diante disto tudo nos resta apenas tirar alguma lição. Acredito que a principal seja o exercício da espera ou desaceleração do nosso ritmo de vida para observarmos com mais propriedade o todo. Seja esse todo a nossa casa, a nossa família, o nosso próprio trabalho, o que temos feito pelo próximo e por nós mesmos.
Espero que possamos manter mesmo diante de tudo o que temos vivido, as melhores expectativas pelo futuro, que hoje infelizmente ainda se mostra completamente incerto. Isto sem perder a fé e os melhores ensejos que tudo se resolva o mais breve e melhor possível. Desejando que este amanhã, após o grande caos, seja possível um renascimento pessoal, em que saibamos valorizar as mínimas e as máximas coisas da vida, por nós mesmos e pelas gerações futuras.
Fernanda A. Fernandes
01/04/2020