IR TRABALHAR OU FICAR EM CASA?
O coronavírus nos transformou em números dentro de uma estatística que tudo mede e tudo sabe. Você está dentro desta estatística, você faz parte da construção de uma curva que todos tentamos achatar.
Passou-me pela cabeça dia desses que dentro de cada número, dentro de cada percentual que mede a progressão da doença, existem pessoas. Na verdade estes percentuais são formados por pais, mães, muitos avós, alguns filhos, aquele vizinho querido, aquele colega de trabalho, o amigo de infância que a tempos não se via.
Num trabalho muito interessante uma rádio de São Paulo resolveu procurar as famílias daquelas pessoas que já morreram contaminadas pelo coronavírus. Humanizaram a estatística e buscaram descobrir quem se encontrava por traz destes gráficos e que davam forma a eles.
Quando se dá nome e sobrenome aos frios números das pesquisas percebe-se que a coisa muda de figura. São pessoas como você que morrem.
Eu ainda não sei o que é melhor para o país, se a liberação das pessoas para que elas possam voltar aos seus trabalhos ou se o melhor mesmo seria elas ficarem em suas casas recolhidas e afastadas do perigo que um organismo microscópico poderia causar.
Os exemplos de países que relaxaram nas medidas preventivas, tal como a Itália e a Espanha e que hoje colhem os frutos amargos de baixas às centenas de seus cidadãos querem nos dizer algo.
Imagino que para um empresário que tenha lá seus mil funcionários trabalhando para o sucesso de sua empresa, enclausurado em seu escritório, inundado em álcool em gel e todo o aparato preventivo que a riqueza lhe proporciona. Longe das gotículas de saliva contaminantes, em seus cálculos financeiros ele raciocina que se a taxa de mortalidade beirar os 5%, em um rápido cálculo, e grandes empresários sabem fazer cálculos rápidos, conclui que dos seus mil funcionários ele poderá perder num quadro normal 50 deles. Ele considera essas perdas bem baixas, afinal são somente números, é justo , afinal a economia não pode estagnar , o país não pode parar , sua empresa menos ainda.
Assim como o general que manda seus soldados para a guerra, mesmo sabendo que muitos irão sucumbir.
Eu não consigo usar esta mesma lógica matemática. Quem sabe seja porque eu não tenho muitos funcionários e conheça todos pelo nome e sobrenome e os tenho como amigos. Conheço suas famílias e eles conhecem a minha. Já confraternizamos juntos muitas vezes, compartilhamos alegrias e tristezas. Faria falta se algum deles adoecesse ou transmitisse a doença para algum de seu familiares. Se viessem a faltar eu me culparia pelo resto da minha vida.
Não meus amigos, não voltarei a trabalhar enquanto não puder dar condições de segurança a qualquer um deles.
Crise? já passamos por muitas e sobrevivemos. Somos brasileiros, não desistimos nunca.
Hoje o perigo da contaminação nos obriga a ficarmos afastados uns dos outros. Não vejo a hora dessa pandemia acabar e poder abraçar a todos. Mas para isso eles precisam estar vivos.