LEMBRANÇAS DO CURSO PRIMÁRIO

LEMBRANÇAS DO CURSO PRIMÁRIO

Grupão de São Vicente, 1956. Recém-chegado do rio Grande do Sul, tive que refazer o terceiro ano primário. Os programas escolares diferiam de estado para estado, principalmente nas matérias Geografia e História. Minha vida escolar havia começado no Grupo Escolar Onofre Pires em Santo Ângelo, Rio Grande do Sul. Matriculado na então Escola Estadual Ziná de Castro Bicudo, hoje Grupão, guardo recordações maravilhosas dessa época. Ao lado do edifício principal, onde ficavam as salas de aula, secretaria, salas de professores, havia uma grande área coberta onde eram formadas as filas das classes. Ali era também o local do recreio, haviam muitos bancos para cinco ou seis lugares encostados nos pilares. Era no recreio que se faziam as amizades, os meninos jogavam Jogo das Pedrinhas ou Cinco Marias, as meninas jogavam queimada ou pulavam amarelinha. Outros ficavam conversando nos bancos ou comendo lanche trazido de casa. Todas as classes de cada período formavam filas ali, separadas por classes e série. Alinhadas em duas colunas, ordenadas por alturas dos alunos, os mais altos na frente e baixinhos atrás. Antes de entrar na sala de aula, cantava-se hinos conforme a data, Hino do Brasil, República, Bandeira, Independência. Muitas vezes eram declamadas poesias, para isso eram escolhidos alunos que tinham boa dicção e falavam alto. O menino ia até a frente da fila de sua classe, subia em um banco grande e declamava a poesia ensinada e decorada, para que todos os alunos do período ouvissem. Após um aviso ou um sermão da diretora, a classes entravam nas salas obedecendo uma ordem decrescente, primeiros os quartos anos, depois os terceiros e sucessivamente. Hoje vejo que esse cerimonial nos dava uma visão geral da escola e fazia nos sentirmos um participante da mesma. Belo dia, a professora me convocou e, no dia certo, subi no banco e declamei uma poesia em homenagem ao pintor Vitor Meireles. Lembro-me só de uma frase: “-Quero ser Vitor Meireles, quero ser pintor!”. Nas classes, cada um no seu lugar e a chamada era feita por nome, só no ginásio eram dados um número para os alunos. A merenda não existia como refeição, havia um lanche. Se bem me lembro, havia um consultório dentário, em que o dentista examinava as bocas e executava pequenos procedimentos. As aulas eram coisa séria, a maioria dos alunos ficava quieta embora, é natural, muitos eram terríveis. Tinha comunicação aos pais, suspensão, expulsão. Todo ano aparecia um fotógrafo e registrava fotos das classes e aluno por aluno. Voltávamos para casa a pé, em um grupo de quatro ou cinco meninos atravessando tranquilamente uma São Vicente bem diferente de hoje. Muitas vezes passávamos na Sorveteria São Paulo para degustar o melhor sorvete que conheci: o picolé ou palito de salada de frutas com pedacinhos de banana e mamão. Isso quando um de nós ou mais tinha dinheiro. No quarto ano, cabulei várias aulas ia com amigos para chocar carona nos bondes. Até o dia que cai do bonde 32 em plena Praça Barão do Rio Branco e fiquei ao lado da roda. Um imenso susto. Cheguei em casa lambuzado de graxa, uniforme imundo de ralar nos paralelepípedos. Nova surra de Dona Zeny e até disso sinto saudades dela.

Paulo Miorim 01/04/2020

Paulo Miorim
Enviado por Paulo Miorim em 01/04/2020
Reeditado em 22/09/2020
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