A SUBIDA DO MONTE.

A subida parcial ao monte exaure, mas conforta, ilumina ampliando, sacia o interior burilando e lapidando arestas na pedra antes bruta, limpando a nódoa gravada no pensamento, tonteado na fervente indagação sufocada e febril, a pedir oxigenação expandida e amenizadora. E precisamos sim, de oxigenação, não só objetiva, dos aparelhos de ventilação que trazem sobrevivência, mas do arcabouço desconhecido da alma que andeja na umidade infértil sem ar e sem luz.

E vai-se do nada à esperança, esfalfado na mágoa da lágrima, arfante no suspiro do cansaço, compensado pelo sabor da conquista de cada dia, que revigora e se anima no calor do sol. O homem cujo horizonte mental se confunde com o horizonte visual não será capaz de virtudes, não dará o primeiro passo; é preciso começar.

Surge do nada o tudo que leva à altura inebriante do encontro perseguido.

Uma demanda permanente que traga paz às grandes questões que agitam o interior, a alma.

Estamos no limiar de uma nova vida, e a ela não são inerentes só objetividades. Na história humana as viradas surpreenderam, e fizeram mudar propósitos até então estáveis.

Não foram construídas por um processo normal. Aconteceram.

Arbitrar sobre o desconhecido o melhor caminho. Parece que foi o que sempre fizemos,parece, mas não com o fio da espada sobre nossas vidas.

O mundo foi apanhado na subida ao monte, sempre dificílima, por alguns de seus habitantes tentada.

Foi-se o tempo, deixou marcas de construção não edificada para abrir com tranquilidade essa porta, mesmo uma vida trabalhada sob o império da consciência, pedra por pedra a erigir a subida. Angustiante, mas confortadora.

No entorno a visão de muitas sombras projetadas nos caminhos caminhados, a procissão da desertificação visível no séquito das nulidades pujantes, carregadas de pecados que não se escondem, uma multidão apagada e cega, muda aos apelos do veio dourado, indiferente às grandes razões onde viceja, brota e cresce a cerebração que encanta e pacifica, toda uma gama de gente esquecida da relativa paz construída por muitos, sofrida a luta, por vezes voluntariosa, temerosa, mas nunca desavinda, súplice de maior espectro, rasgando horizontes de cores incomuns, poente da vida vivida no prodígio de ser para existir sem forma, incorporeamente, metafisicamente ainda em corpo. Sortilégio, vida anímica; esperança.

O temor fica na graça pouca que podia ser muita, do sentimento pequeno que precisava ser gigante, da sensibilidade apoucada quando queria ser cheia, mas havia luz ampliada no encontro nas sebes do desencontro em clausura empobrecida, mas já era muito, mais do que merecido, menos do que pretendido, rebrilhava a consciência.Agora se mostra em plenitude o devir. Do Lácio, que tanto sofre agora, nos veio esse conceito filosófico de chegar, “devenire”, que indica mudanças pelas quais passa o mundo, todo. Lá está o sangue que movimenta meu corpo, e minha alma..

Ao longe o pico do monte, divisado ainda não alcançado, desafiante, impassível a mostrar sua altura inatingível, mirando sem olhar por estar acima, soberano, subida honra penetrá-lo em seu topo, podendo, honorabilidade distante, fugidia embora bailando passos de aceno em nossa percepção, virtude das alturas que se esconde por ser natural, mais simples que a simplicidade, mais virtuoso que a virtude, estava ali, generoso, por pertencer à natureza como nós, sem alardes, nunca como vestal, enraizado na Terra Mãe, e abraçado privilegiadamente pelo céu, exclusivamente com sua propriedade imanente às alturas; tinha o dom, era sábio, o topo do monte.

Para lá se movimentavam alguns, buscadores, aos tropeços, miravam o “dharma”.

Poucos chegaram, entenderam e compreenderam o que podia assolar a negação de ser para existir, sabiam e souberam dizer antes das grandes comoções, que o espaço no topo do monte era exíguo, e que mais um passo levaria a uma grande queda.

Estavam no topo e o espaço é pequeno para abrigar multidões.

“Nosce te ipsum”, "Conhece-te a ti mesmo", do latim, do Lácio chegado vertido do grego, máxima inscrita na entrada do Templo de Apolo em Delfos, colocou Sócrates interrogativo, estabelecendo por isso seu grande princípio, “Sei que nada sei”. O que tantos ignoraram entre agressões e desamor, restringindo a dignidade humana, desde sua sobrevivência natural à negação de sua liberdade pelos ímpios.

Muitos não sabem o mínimo, escravizamos nosso ser quando não encontramos o mínimo do que somos, é a mutilação da liberdade.

Para conhecermos os outros, o mundo, suas emoções, suas artes, seus “devires” impõe-se antes exercer o “nosce te ipson”, assim chegaremos ao menos ao pé do monte.

Esse o primeiro passo para subir ao monte, conhecendo e avaliando todos os outros passos no nosso maior tribunal, a consciência.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 30/03/2020
Código do texto: T6901905
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