SURURU FRESCO!
SURURU FRESCO!
Em tempos de quarentena, em plena quaresma de 2020, lembrei de minha infância e adolescência, quando morava no Trapiche da Barra, bairro localizado entre o mar da Praia do Sobral e a Lagoa do Mundaú, na capital alagoana, Maceió!
Àquela época, todas as manhãs, percorriam o bairro diversas marisqueiras que, carregando em suas cabeças uma enorme bacia metálica, ofereciam o seu produto gritando bem alto, quase a se esgoelarem, SURURU FRESCO, SURURU FRESCO!
As bacias ficavam apoiadas em panos que, de tão encardidos, esqueciam que foram brancos um dia! Serviam para proteger o couro cabeludo das marisqueiras, do atrito com a bacia metálica, enquanto deambulavam pelas ruas num intrigante exercício de equilibrismo! Serviam também, os panos, para segurar o caldo escuro que escorria das bordas da bacia.
Passavam também, pelas nossas ruas, os pescadores vendendo seus peixes; “Olha a Carapeba! Olha o Camurim! Cavala fresca! Cavala Fresca! Olha o Camarão! Olha a Carapeba!”.
Porém, eram as marisqueiras quem mais me chamava a atenção! Não sei se ainda hoje elas continuam a percorrer as ruas do Trapiche, oferecendo seus produtos; o Sururu Despinicado (sem a casca, ou concha), e o Sururu de Capote (ainda na casca). A casca do Sururu é escura, e as duas bandas abertas parecem um capote, revestindo o molusco amarelado, que serve para um prato típico delicioso aqui da minha Alagoas.
Vejo hoje, quando passo pela orla lagunar, enormes montes de conchas, que enchem contêineres e esborram pela via, incorporando-se à paisagem triste e bela ao mesmo tempo, com as palafitas e barracos das marisqueiras e pescadores, e a Lagoa Mundaú ao fundo. Se por um lado, a lagoa dá a essas pessoas uma fonte de renda, por outro lado, elas não têm qualquer assistência social por parte do Estado, vivendo e trabalhando em um ambiente putrefato e insalubre! É o fruto da imensa desigualdade social!
Atualmente moro em outro bairro, Ponta Verde, que tem vocação turística e é razoavelmente cuidado pelo Estado. Temos uma Balança do Peixe, mais organizada e um pouco mais higiênica, para a comercialização dos pescados. Também temos carros que percorrem as ruas do bairro diariamente que, com seus autofalantes, oferecem peixes, camarões e Sururu. É o chamado progresso!
Por isso que hoje, recluso em casa devido à quarentena do Corona Vírus, quase na Semana Santa, não ouço mais os gritos das marisqueiras oferecendo “SURURU FRESCO, SURURU FRESCO!”. Saudades!