Fogo na lona
Havia muita gente engraçada naquela cidade, mas Rildo era insuperável, o jovem era um pândego.
Desde o primário fazia sucesso com suas galhofas.
Um menino mimado de sua sala no terceiro ano primário chamado Henrique tinha um belo estojo de lápis coloridos com muitas peças, ninguém tinha outro igual. Rildo não tinha nenhum, mas para fazer a tarefa precisava de ao menos duas cores diferentes. Então propôs uma troca de dois lápis por duas bolinhas. O menino mimado imaginou duas bolinhas de vidro com as quais poderia brincar sozinho sem jamais apostá-la nos jogos da hora do recreio. Rildo disse para Henrique que as bolinhas estavam em sua casa, guardadas em um saco de couro que ficava com o Tico; ele poderia ir buscar após a aula ou quando desejasse. Negócio fechado, Rildo recebeu dois lápis com cores diferentes pra fazer o seu trabalho.
Ao término da aula Henrique acompanhou Rildo até sua casa para receber sua parte. Chegando ao local queria conhecer o Tico. Ficou sabendo que Tico era um bode bravo e as bolinhas que possuía eram seu saco escrotal. Depois de muita zombaria os lápis foram devolvidos para Henrique que se retirou muito irritado.
Muitas piadas e anedotas depois, Rildo tornou-se um sujeito popular. Não havia no lugar quem não o conhecesse. Nas festas de aniversário, lá estava ele contando as suas. Casamentos, batizados e funerais também contavam com Rildo para descontrair o ambiente. Os que podiam, ofereciam a ele alguns trocados.
Foi quando o dono de um bar noturno o contratou para contar histórias, piadas e cantar algumas músicas sertanejas enquanto dedilhava um violão de onde aprendera tirar algumas notas. Durante a semana cuidava dos animais que sua família criava num sitio, a noite e nos finais de semana, divertia os frequentadores do bar e ganhava um extra.
O dono do bar candidatou-se a vereador e Rildo foi contratado para ajudar na campanha, gostou. Os candidatos passaram a disputá-lo para suas campanhas, ele estava feliz, seu cachê já havia triplicado, ele falava o que muitos queriam ouvir. Terminada a campanha, Rildo voltou a depender dos bichos do sitio e dos extras do bar.
Logo após as eleições, surgiu um circo na cidade. Quando o dono do circo viu Rildo se apresentando no bar, interessou-se logo por ele. No próximo fim de semana, ele já era a atração principal no picadeiro. Suas piadas faziam o público delirar de tanto rir.
Numa noite em que estava muito inspirado, contava a estória de um caipira que fumava um cigarro de palha, ele havia preparado um pedaço de madeira que representaria um enorme palito com o qual acenderia o “pito”, a chama era grande; tão grande que iniciou um pequeno incêndio no palco. Ele ria nervosamente enquanto tentava apagar o fogo, o público ria a valer enquanto aplaudia efusivamente.
O fogo alastrou para a lona e o público ainda não se dera conta da gravidade do problema, gargalhavam de chorar. Foi apenas quando viram os palhaços, o domador de elefantes e até a bela trapezista de biquíni que aguardava a hora da sua apresentação, chegando com baldes de água para ajudar eliminar as chamas que o público percebeu que a coisa era séria. Tarde demais.
Houve um corre-corre, alguns morreram pisoteados, outros queimados e o circo se acabou em chamas.
Chamas acesas pelo astro principal enquanto o público só ria.