"Bozominismo"

Para conter o avanço do Coronavírus em Alagoas, ontem, o governador Renan Filho editou um decreto de emergência determinando o fechamento de diversos estabelecimentos comerciais, estabelecendo, além disso, que pessoas gripadas deverão ficar em casa por um período mínimo de 14 dias. Essa medida vale para os 102 municípios alagoanos. Em outra frente, está suspendendo a cobrança de encargos tributários à classe empresarial alagoana. Mas até o momento não ouvi ou li nada a respeito de auxílio do governo de Alagoas aos alagoanos em condição financeira desfavorável, alagoanos desempregados ou em situação de rua.

É, sobretudo, nestes momentos de calamidade que vejo que o Estado jamais pode ser mínimo. O Estado deve ser máximo; não pode nem deve se ausentar de sua responsabilidade coletiva, de ser esteio dos desvalidos pelo Capital.

Ontem, ainda trabalhando, ouvi de um palmarino que o dinheiro que tem guardado (R$ 100,00) mal dará para alimentar sua família por, sendo otimista, sete dias. É um relato triste esse, mas há outros, muitos outros ainda mais desoladores. Esse palmarino, como o conheço de vista, sei que tem, pelo menos, por difícil que seja sua situação, tem um lar e aparenta razoável saúde. Mas e os milhares de alagoanos, como aponta a estatística, que vivem em situação de rua, sem um vintém no bolso e de saúde defasada: que farão quando o Coronavírus lhes bater à porta? Aliás, que porta? Melhor dizer: bater-lhes à lona ou à cara. Quem lhes defenderá do flagelo?

Não sou religioso, mas respeito quem acha que Deus será suficiente para defender os nossos alagoanos que estão na linha de frente do Coronavírus. Eu, contudo, vejo que o Estado, aliado a Deus, trataria com humanidade e eficácia esses alagoanos esquecidos pelo Capital. Deus poderia dar a força espiritual; o Estado, fornecer socorro financeiro e a infraestrutura necessária para superarmos o flagelo que se aproxima. Porém não é o que vejo. O que vejo, não apenas por parte do governo alagoano, mas do brasileiro principalmente, é um faz de conta e desdém quando o assunto é cuidar dos brasileiros que vivem à margem do Capital; que não têm plano de saúde, trabalho, um lar. Estes estão entregues à própria sorte, ainda que crentes no auxílio divino.

Neste momento de pandemia, principalmente, deveria o Estado fortalecer o SUS e os programas sociais. Porém não é o que está acontecendo. Li que o Governo está cortando verbas do Bolsa Família; investindo dinheiro público no Sistema Privado de Saúde — o que é um contrassenso. Este Estado mínimo não serve aos brasileiros, mas a uma elite que, embora se esforce para parecer o oposto, pouco se importa com a melhoria na qualidade de vida dos brasileiros.

A meu ver, quem defende Estado mínimo, além de mau-caráter, é escroto, burguês, adepto do sacanismo. Quando esse defensor do Estado mínimo mora no Leblon, tem ações na Nasdaq, uns milhões em imóveis, plano de saúde topado, eu compreendo o conflito de interesses e até o perdoo do pecado da cobiça e da falta de senso de coletividade. Porém, quando o defensor do Estado mínimo não dispõe dos privilégios do Capital, esse defensor neoliberalista só pode sofrer de "bozominismo", doença que acomete milhões de brasileiros, principalmente os de mau-caráter.

Damião Caetano da Silva
Enviado por Damião Caetano da Silva em 21/03/2020
Reeditado em 21/03/2020
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