Rotina
Acordei.
O abajur continua aceso, angustiado, não conseguiu pregar os olhos a noite inteira, maldita insônia. O ventilador parece tranquilo, apesar do pigarro que insiste em lhe tirar a paciência, eu deveria realmente tirar a poeira desse quarto.
Na sala, o sofá observa a televisão dar um chilique, ao que parece ela sente falta de quando nós passávamos mais tempo juntas. Na varanda, duas cadeiras conversam sobre a vida, enquanto levam um ventinho, uma delas está no meio de uma reflexão sobre como as mesas seriam inúteis sem elas, será mesmo?
Na cozinha é uma barulheira só, as panelas reclamam da bagunça daquele armário, a cafeteira me olha com descaso, a geladeira discute com o freezer, ela pensa em esquentar a relação, mas ele é sempre muito frio, será que tem futuro?
Preparei um café, ainda que o humor da cafeteira estivesse amargo, coloquei em uma caneca que me sorriu, simpática. Voltei ao quarto, peguei no flagra uma conversa do meu óculos com o livro de cabeceira, ele dizia que eu só vejo o lado negativo da vida, que não aguenta mais me ver tão cega para as coisas boas, o livro lhe disse para ter calma que as coisas ficariam mais claras com o tempo.
Aquilo me rendeu um bom tempo de reflexão, olhei tanto para o teto que ele me olhou de volta, virei de bruços e o travesseiro, me vendo angustiada, fez carinho nos meus cabelos, a cama me abraçou. Gotas de conforto, no caos rotineiro.