Nenhuma Guerra Acontece

“São tempos de guerra. Pessoas estão morrendo em campos de concentração, na Áustria, Polônia e você vem me falar de tecidos e novos ternos. Por favor, seja menos, muito menos frívolo.”

“Não seja humanitária, isto não combina contigo. Duas horas atrás reclamava que Paris perdeu seu brilho, por conta da invasão alemã pela Gestapo e que não é mais a capital da moda.”

“Apenas constatava a realidade. Os comércios de renome estão fechados e nossos amigos da alta-sociedade, estão no campo.”

“Provavelmente, caçando.”

“Exatamente. Matando inocentes esquilos. Você que fique com seus ternos antigos, eles são bons. Faz menos de dois anos que comprou eles. Você não irá morrer, se trajar tecidos lavados diversas vezes.”

“Talvez sim, talvez não. Escutei múltiplas vezes que para morrer basta estar vivo, portanto agora mesmo posso ter um ataque cardíaco ou asmático e ficar sem respirar eternamente.”

“Não fale de morte. Você é insensato. Mesmo que tu não creia em mim, saiba que me convaleço ao pensar em tantos milhares de judeus ou outras minorias que sofrem de inanição, abusos e mortes horrendas. Recorta o nome do pai de minha mãe?

“Era Lindbergh, Benjamin Lindbergh.”

“Correto, um nome tipicamente judaica, para um típico judeu. Se ele fosse meu avó paterno, provavelmente seria judia. E nós, não teríamos nos casado, e eu estaria em Auschwitz agora mesmo, viva ou morta. Eu sei que estaria lá ou noutro campo, porque não teria coragem de fugir... Eu sei que não. Aquela estória de; é melhor morrer lutando do que morrer sem fazer nada, não funciona para mim. Sou recatada demais, para viver aventuras.”

“Deixe disto, viveremos como se nada estivesse acontecendo, afinal minha querida, não é porque estamos estamos atravessando uma segunda guerra que temos de virar filantrópicos ou missionários. Todos os dias antes ou depois do início ou fim dos confrontos, pessoas morriam e continuarão à morrer e à passar fome. Por este período seja insensata como disse que eu sou. Se fizeres isto, continuará vivendo como sempre vivemos, ou seja, existirá dentro de uma bolha mundana, artificial. Querida, entenda e coloque na sua cabeça. Que à muito existem conflitos no Oriente médio e nós nunca nos importamos, nem nossos pais importavam-se. Continuamos existindo alienados, pensando que eles são loucos. Vamos pensar o mesmo sobre o Ocidente?”

“Você está certo, minha vida não mudou em nada. Posso até ficar melancólica com o que vejo ou ouso, mas deixar que estes acontecimentos me façam cair num poço de tristeza, não é algo que permitirei.”

Helena de La Dauphin
Enviado por Helena de La Dauphin em 29/02/2020
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