A mesma isca que me pesca

VOU VOLTAR PARA A ARMADILHA DENTRO DO MAR DE ONDE NUNCA SAÍ

Sou como um

peixe que só

conhece o fundo

do seu mar.

E se com uma isca

eu me encontrar,

é claro que vou nela

fisgar.

E mesmo temendo

que numa armadilha

eu posso entrar.

Sendo levado para

fora d'água não

podendo mais

respirar.

Mas se por sorte

conseguir escapar e

novamente para o mar

eu voltar e seguidamente

com a isca do anzol

me deparar.

Irei como da primeira

vez naquela armadilha

penar.

Sem aprender a

lição e com ânsia de

querer estar solto no

fundo do mar.

Irei quantas vezes

for na mesma rede

entrar.

E toda vez que

com o anzol me

deparar irei novamente

com o pescador me encontrar.

🎏

Um conto que se repete

Eu vou começar a falar mas agora eu não sei o que é esperado e o que eu não falar é porque minha fala será assustadora e ligeiramente interrompida. Mesmo sendo sentida de todas as formas, mesmo não falando, mesmo me silenciando a fala, mesmo escondendo o que sinto por dentro em dias tão ligeiros, em marés tão pequenas com profundidades tão intensas. Ainda estarei aqui respirando com os olhos abertos, ocasionalmente fechado e falando de um até três, contando de dois até vinte e dizendo o A, B, C, D, E. Mas ainda mudo, mas ainda sozinho, mas ainda melancólico, mas ainda aqui, nesse mar pequeno de uma profundamente gigante.

E eu achando que este é o meu maior problema: não conseguir me locomover, sair de tão longe de onde estou para um lugar onde eu possa conseguir estar e me fixar ali como fazia no mar. Esse é meu maior problema. Eu posso falar, posso cantar, posso nadar ligeiramente pelo mar e mesmo assim ainda estarei tão perto do tão longe que eu deveria mergulhar.

Uma vez quando criança tinha esquecido minha identidade. Procurava de forma desesperadamente por ela. Revirava por todo o oceano, olhava de baixo de cada ostra e ouriço-do-mar enquanto acumulava lágrimas de desespero, saudade e com uma imensa ânsia de achá-la. Me debatia cada vez mais angustiado tentando a qualquer custo essa identidade achar. Eu não sabia onde ela estava e a todo momento que procurava por ela tinha mais certeza de que não iria encontrá-la. Era desesperante o quanto eu queria tê-la, mas eu não a encontrei. Só depois de dias que consegui essa identidade já feita, já fotografada, já esperada para ser minha. Estará ela agora no fundo do mar ou irei eu me iludir que com um pescador eu poderei me encontrar.

Eu tenho problemas sim, sou um peixe que luta para aprender a nadar. Eu tenho problemas em conversar, eu tenho e quem é que não tem problemas, não é mesmo? Não só acumulo como guardo de forma sistemática dentro do bolso. Vou deixando ali até que se encontre com alguma solução. Ela não deve ficar por muito tempo, mas já reparo que junto com outros problemas a amizade entre elas é inevitável.

Não sou uma peixe problemático. Posso dizer que guardo elas no bolso, mas sou metódico e um pouquinho niilista. Além de ser um peixinho que vive entre o oito ou o oitenta. Sempre em uma busca constante por algo que me dará muito apego e ao mesmo tempo desligado e apático com a mesma coisa que tanto queria e desejo.

Tenho dificuldades em ser objetivo. Sou inconstante, balanço de um lado para o outro, me recusou a permanecer fixo e permanente. Ao mesmo tempo que me ligo, me desligo e são poucas as coisas que conseguem me reconectar com a ligação que já foi perdida.

Se vivo em um aquário achando que estou livre no mar, eu não sei. Se me alimentam com ração ou sou eu que devo minha própria comida caçar, também não sei. Se sou um peixe tão insignificante que dentro ou fora do mar não diferêncio e nem me arrisco a nadar á beira do oceano... Se vivo voltando ao mesmo mar que um dia foi meu lar e que agora não encontro uma boa fonte para achar... São tantos "ses" para um único peixe lidar que nem o oceano pode de perto mensurar.

Mas enfim, vou morrer afogado dentro do meu próprio mar que nem fora d'água um peixe como eu, com uma velha identidade, se ariscará a andar. Voltando sempre para a mesma isca a qual romantizei e novamente iria fisgar. Não tenho jeito, outra vez ao pescador irei me entregar.

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iaGovinda
Enviado por iaGovinda em 29/02/2020
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