Canta e Dança Brasil

Nosso dançar e nosso cantar vem sendo delicadamente formado por encontro de etnias diversas que, orientado pelos interesses do colonizador, resolveram, além de se encontrar, miscigenarem-se sem qualquer moderação.

Essas etnias, juntas e misturadas, tinham característica muito forte e comum: a diversidade.

O colonizador, cuja história é pontilhada de invasões e domínios, de plasticidade capaz de misturar-se, absorver e influenciar a cultura dos invasores e dominadores, bem como dos dominados.

O nativo indígena, cujas teorias de sua origem, indicam ser diversa: Ásia e Oceania (Polinésia). Diverso em suas línguas, características físicas e costumes.

O escravo africano, de mesma forma que o nativo indígena, numa diversidade de etnias. Diversidade em origem regional africana, em línguas, características físicas e costumes.

Quando aqui chegou, o colonizador já encontrou cantos e danças diversas das diferentes tribos, mas caraterizados por andamento lento e limitação de instrumentos musicais, restritos aos rítmicos: maraca e curimbó (percussão em tronco de árvores).

Mas, ao chegar trazia seu cantar e dançar fruto de sua plasticidade, capacidade de assimilar e influenciar as culturas que o dominaram, bem como as que Portugal dominou. Tinha variedade de instrumentos rítmicos, de melodia e harmonia.

Mas, chega o africano e, com ele, diversidade de cantos e danças. Andamento muito mais rápido que o indígena e instrumentos rítmicos em sua maioria.

O Brasil de dimensões e diversidade de características geográficas continentais, processou essa miscigenação em formas diferentes. O resultado disso: diversidade imensa de formas de dançar e cantar bem identificadas por cada uma de nossas regiões. Mesmo dentro dessas regiões, conforme seja maior a influência africana ou indígena, temos grande diversidade.

Não podemos deixar de observar que a região Sul foge desse padrão de diversidade, pois, houve troca de territórios. Territórios dominados pelos portugueses foram trocados por territórios dominados por espanhóis. Além disso, o sul teve grande afluxo de migração de italianos da região norte da Itália, de alemães e poloneses, que não tem essa característica de plasticidade do colonizador português.

E, assim, o Brasil canta e dança numa diversidade de formas em cada uma de suas regiões. Formas várias fruto desse encontro, juntos e misturados, da diversidade portuguesa (espanhola no extremo sul), da diversidade do nativo e da diversidade africana.

Somente com a intenção de ilustrar essa nossa diversidade: canta e dança o norte brasileiro seu carimbó, seu pássaro junino, seu boi bumbá, sua lambada, seu lundu marajoara ...; canta e dança o nordeste brasileiro seu frevo, seu xaxado, seu baião, seu axé, sua ciranda, seu forró ...; canta e dança o sudeste brasileiro seu samba, seu jongo, seu samba de roda, sua ciranda caiçara...; canta e dança o centro oeste brasileiro seu cateretê, seu tambor, seu siriri, seu cururu...; canta e dança o sul brasileiro sua chula, seu fandango, seu pau de fitas, seu boi de mamão, sua milonga...

Entretanto, apesar dessa imensa diversidade, assim como o colonizador conseguiu a unidade por meio de única língua, a língua com a qual cantamos essa imensa variedade de manifestações regionais, aconteceu fenômeno similar e canta-se e dança-se em todas as regiões de forma única, um dançar e um cantar único, o Carnaval dos Blocos de Rua.

Quais causas explicariam esse fenômeno? Provavelmente, não se reduz a única causa, mas a conjunto delas, das quais arriscaríamos destacar duas desse conjunto.

A primeira é que a matriz dos carnavais, provavelmente, encontra-se nas cerimônias realizadas pelas comunidades mais antigas nos períodos de plantio e de colheita.

Segundo remotas tradições, as comunidades deviam dançar, brincar e festejar muito, para que a fecundidade do solo transformasse as sementes em bons e saborosos frutos.

Na origem dos carnavais, resposta razoável a uma de nossas lutas primordiais: “permanecer” - continuarmos semente - e o “mudar” - lançarmo-nos à fertilidade do solo, transformando-nos em árvores para dar frutos.

A segunda é que quando cantamos e dançamos o carnaval dos blocos de rua, a inversão do cotidiano vem acompanhada da ideia e do sentimento de mudança ou de renascimento.

Ao invertermos a ordem estabelecida, experimentamos a liberdade, a participação, a expressão da individualidade e, sobretudo, a igualdade. Semeamos no solo árido da realidade a utopia das comunidades.

Na verdade, pouco importa as causas, o que importa é que sobre essa intensa diversidade regional, forjada em intensa miscigenação de etnias, surgiu um cantar e um dançar único que, com o tempo foi acrescentando temperos regionais.

E assim, nesse movimento plástico de mútuas influências regionais, não somente o cantar e dançar, mas o povo brasileiro caminha para realizar a construção de nova civilização.

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