UM "QUASE" INSTITUTO DE BELEZA
Da série: Sob o sol dos meus melhores dias
Era numa daquelas tardes de chuva quietinha e tudo de que me lembro era o cheiro acre e nostálgico das laranjeiras em flor.
Eu me encontrava ali,naquêle galpão.Diante de mim,relegado ao escuro e empoeirado abandono do ambiente:o velho guarda roupa;de um verniz ordinário.O espelho retangular apresentando uma fenda na parte superior,insinuando resguardar por detrás da moldura,algumas caras soterradas pelo tempo (outras pela propria terra),que me foram bem familiares em épocas passadas.
Dona Dida,minha mãe,certo dia decidiu que seria uma cabeleireira. Tia Lila, sua irmã, que era expert no assunto lhe deu as primeiras dicas e então, dona Dida, “ se achando “ partiu para o novo empreendimento.
Exerceu o seu trabalho num tempo em que os modismos de então requeriam o uso de mal cheirosos líquidos de permanente,laquês e as famosas loções "Pindorama e Negrita" para o tingimento dos cabelos. O luxo ficava por conta do laquê que minha prima lhe trazia das lojas do centro.
“Contém PVP – polivinilpirrolidona" - que fixa dez vezes mais !
Faziam questão de enfatizar a ação quase milagrosa do dito “polivinilpirrolidona” que nenhuma das duas fazia a menor idéia do que se tratava,mas achavam chic frisar à clientela aquele quase palavrão.
Um dos compartimentos de nossa casa foi escolhido para o que se imaginava um "Instituo de Beleza".Algumas cadeiras ladeando as paredes,prateleiras com os produtos,a mesa redonda repleta de bigodins,e num dos cantos:o velho guarda roupa.Aproveitado que fora, em função do seu grande espelho, diante do qual,miraram-se centenas de rostos;alguns bem afeiçoados,outros nem tanto,oriundos dos mais distantes e diferentes lugares,sempre na busca da tão sonhada beleza.
Como dona Dida era boa de papo, a fama correu boca a boca e com muita frequência a frente de nossa casa ficava repleta de carroças vindas das colonias de agricultores conduzindo uma sonhadora a mais com a tão desejada beleza.
Mantendo a tradição de excentricidade , a cabeleireira inovou, servindo almoço, café e se bobeassem...Até janta!
[ Uma das razões do Instituto trabalhar quase sempre no vermelho]
Mas valia a máxima do famoso “não dá lucro mas é divertido”. Assim, Luzia que morava conosco, tinha sempre algumas ajudantes na cozinha.Uma cortava os tomates, a outra debruçava-se no rolo de macarrão , outra adentrava com o maço de cheiro verde colhido no quintal...
Aos poucos, aquela casa da mãe Joana,passou a funcionar como um ponto de encontro para empanturramentos e o salão foi ficando meio que relegado a segundo plano. As “permanentes a frio”, os cortes ,as tinturas e penteados, foram sofrendo um certo desaceleramento.
Fazer as refeições na casa de dona Dida era o sonho de consumo daquele pessoal que vinha d e longe.
Porém, as amigas da cabeleireira - tocadas pelo espírito da partilha -começaram a desembarcar de suas carroças com “agradinhos”.
Torresmos,galinhas,ovos,requeijão,queijos,pranchas de leitões,pães , bolachas e cervejas caseiras etc...etc...tudo para “ajudar” na comilança.
Os almoços eram verdadeiras festas ! A mesa sempre repleta e muitos convites para ser madrinha de batismo,de crisma, de casamento, enfim...
No inicio dos anos 80 e quase no final das atividades do salão de dona Hilda, o mundo anestesiara-se diante da beleza de Lady Diana e a pompa de seu casamento.
Uma jovem muito bonita adentra ao ”instituto”.
Pede um corte ao estilo Lady Dy.
[ Ai ! Ela é tão linda ! E meus olhos se parecem com os dela ]
A cabeleireira, muito falante, desce a tesoura nos cabelos da moça.
O resultado foi uma princesa no sentido inverso. A moça de olhos verdes, faiscantes, queria naquele momento, fazer picadinho da cabeleireira.
Sem chance ! Eis que esta lhe sugere acalmar-se,tomar um chasinho de melissa (ela mantinha sempre uma caneca do dito cujo ao redor do fogão) que tudo seria “resolvido a contento”.
[ Deus da jeito pra tudo ! disse carinhosamente à moça que estava à beira de um ataque de nervos ]
Pente pra cá, pente pra lá, laquê em abundância e quando a moça mirou-se no espelho, sentiu-se satisfeita.
Dona Dida, então, não perdeu a oportunidade de lançar a sua pérola:
-Viu ! Nunca duvides de mim. Eu e esse laquê (que contém “polivinilpirrolidona” fazemos miséria!)
-Verdade dona Dida.A senhora merece um beijo !
Ah! Como fiquei linda !
Joel Gomes Teixeira
Da série: Sob o sol dos meus melhores dias
Era numa daquelas tardes de chuva quietinha e tudo de que me lembro era o cheiro acre e nostálgico das laranjeiras em flor.
Eu me encontrava ali,naquêle galpão.Diante de mim,relegado ao escuro e empoeirado abandono do ambiente:o velho guarda roupa;de um verniz ordinário.O espelho retangular apresentando uma fenda na parte superior,insinuando resguardar por detrás da moldura,algumas caras soterradas pelo tempo (outras pela propria terra),que me foram bem familiares em épocas passadas.
Dona Dida,minha mãe,certo dia decidiu que seria uma cabeleireira. Tia Lila, sua irmã, que era expert no assunto lhe deu as primeiras dicas e então, dona Dida, “ se achando “ partiu para o novo empreendimento.
Exerceu o seu trabalho num tempo em que os modismos de então requeriam o uso de mal cheirosos líquidos de permanente,laquês e as famosas loções "Pindorama e Negrita" para o tingimento dos cabelos. O luxo ficava por conta do laquê que minha prima lhe trazia das lojas do centro.
“Contém PVP – polivinilpirrolidona" - que fixa dez vezes mais !
Faziam questão de enfatizar a ação quase milagrosa do dito “polivinilpirrolidona” que nenhuma das duas fazia a menor idéia do que se tratava,mas achavam chic frisar à clientela aquele quase palavrão.
Um dos compartimentos de nossa casa foi escolhido para o que se imaginava um "Instituo de Beleza".Algumas cadeiras ladeando as paredes,prateleiras com os produtos,a mesa redonda repleta de bigodins,e num dos cantos:o velho guarda roupa.Aproveitado que fora, em função do seu grande espelho, diante do qual,miraram-se centenas de rostos;alguns bem afeiçoados,outros nem tanto,oriundos dos mais distantes e diferentes lugares,sempre na busca da tão sonhada beleza.
Como dona Dida era boa de papo, a fama correu boca a boca e com muita frequência a frente de nossa casa ficava repleta de carroças vindas das colonias de agricultores conduzindo uma sonhadora a mais com a tão desejada beleza.
Mantendo a tradição de excentricidade , a cabeleireira inovou, servindo almoço, café e se bobeassem...Até janta!
[ Uma das razões do Instituto trabalhar quase sempre no vermelho]
Mas valia a máxima do famoso “não dá lucro mas é divertido”. Assim, Luzia que morava conosco, tinha sempre algumas ajudantes na cozinha.Uma cortava os tomates, a outra debruçava-se no rolo de macarrão , outra adentrava com o maço de cheiro verde colhido no quintal...
Aos poucos, aquela casa da mãe Joana,passou a funcionar como um ponto de encontro para empanturramentos e o salão foi ficando meio que relegado a segundo plano. As “permanentes a frio”, os cortes ,as tinturas e penteados, foram sofrendo um certo desaceleramento.
Fazer as refeições na casa de dona Dida era o sonho de consumo daquele pessoal que vinha d e longe.
Porém, as amigas da cabeleireira - tocadas pelo espírito da partilha -começaram a desembarcar de suas carroças com “agradinhos”.
Torresmos,galinhas,ovos,requeijão,queijos,pranchas de leitões,pães , bolachas e cervejas caseiras etc...etc...tudo para “ajudar” na comilança.
Os almoços eram verdadeiras festas ! A mesa sempre repleta e muitos convites para ser madrinha de batismo,de crisma, de casamento, enfim...
No inicio dos anos 80 e quase no final das atividades do salão de dona Hilda, o mundo anestesiara-se diante da beleza de Lady Diana e a pompa de seu casamento.
Uma jovem muito bonita adentra ao ”instituto”.
Pede um corte ao estilo Lady Dy.
[ Ai ! Ela é tão linda ! E meus olhos se parecem com os dela ]
A cabeleireira, muito falante, desce a tesoura nos cabelos da moça.
O resultado foi uma princesa no sentido inverso. A moça de olhos verdes, faiscantes, queria naquele momento, fazer picadinho da cabeleireira.
Sem chance ! Eis que esta lhe sugere acalmar-se,tomar um chasinho de melissa (ela mantinha sempre uma caneca do dito cujo ao redor do fogão) que tudo seria “resolvido a contento”.
[ Deus da jeito pra tudo ! disse carinhosamente à moça que estava à beira de um ataque de nervos ]
Pente pra cá, pente pra lá, laquê em abundância e quando a moça mirou-se no espelho, sentiu-se satisfeita.
Dona Dida, então, não perdeu a oportunidade de lançar a sua pérola:
-Viu ! Nunca duvides de mim. Eu e esse laquê (que contém “polivinilpirrolidona” fazemos miséria!)
-Verdade dona Dida.A senhora merece um beijo !
Ah! Como fiquei linda !
Joel Gomes Teixeira