O Melado

Gosto de contar histórias. Mamãe teve seu último filho, há 41 anos. Teve complicações no parto. Foi encaminhada ao Hospital da Previdência, em Belo Horizonte, e por lá se tratou por uns quarenta dias. A quarentena afastou seus cinco filhos e, também, a Naná, a nossa segunda mãe. Eu sempre a nomeiei assim, porque mamãe fez carreira no Estado, de professora a Diretora de Escola e, por isso, trabalhava sem cessar. Dividiu a maternidade com a Naná, pessoa que cuidava dos filhos e da casa, por 50 anos seguidos , até falecer em 2018. Pois bem, com o tratamento da mamãe e, por causa da gravidade de sua enfermidade, todos suspeitavam que ela não escaparia com vida, de menos nós, seus filhinhos. Deixaria órfãos seus cinco filhos. Eu e Carla, por causa da escola, passamos essa quarentena com a família paterna, na casa de minha avó e nas casas das tias. Lembro-me que almoçávamos frequentemente na casa da tia Margarida Castro e tio Ildeu Gomes. Ela era excelente dona de casa e comandava tudo com muito cuidado. Preparava o menu para a cozinheira fazer. Havia coisas que era muito diferente da minha casa: o almoço era pomposamente servido e todos se sentavam à mesa, bonita e fina. Tinha suco natural bem geladinho e sempre havia sobremesa. Uma delas, não me esqueço: melado com queijo fresco. Ah, que delícia! Outro dia comentei com a mamãe sobre essas lembranças. Hoje, quando cheguei para ajudá-la a cozinhar para família, como sempre

fazemos aos domingos - a cada dia ela começa mais cedo e dou mais apoio moral do que a ajuda culinária - ela tirou um guardanapo de uma louça e disse: - Cassinha, adivinhe o que é? Meus olhos caíram dentro da louça, curiosos, e adivinharam: - Melado da tia Margarida! Rimos à toa... Isso puxou o fio relacionado ao melado, como o dito: "quem nunca comeu melado, quando come se lambuza". Também a história fantástica do Esquindim Gererê, contada na nossa região, sobre um homem que recolhia crianças desavisadas, que saíam escondidas de perto de seus pais. Ele as colocava num saco para comê-las depois. Porém, sua maldade um dia terminou com seus planos descobertos e ele jogado numa tacha fervente de melado de cana-de-açúcar. Uma história horripilante do começo ao fim.

Voltando ao assunto da crônica... meu dia ficou doce, doce, com o melado que mamãe preparou.

Cassia Caryne
Enviado por Cassia Caryne em 19/01/2020
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