foto: meus filhos crianças - da esquerda para direita ou do menor para o maior.
Harley, Eduardo, Fernando e Rafael.
Quando as Crianças Crescem e os Adultos Vão Embora
Um dia você acorda, abre a porta do quarto das crianças e as crianças não estão mais lá. Agora, em seus lugares, os seus olhos percorrem os corpos adultos que descansam após um dia de trabalho ou de uma noitada de festa, ou de estudo. E você leva um susto. Esteve tão ocupada em atendê-las nas suas necessidades básicas de sobrevivência, tão absorvida e envolvida no trabalho para lhes abrir caminhos e oportunidades e, distraída nesses afazeres, não as viu sair. Elas, por sua vez, também não se deram conta do tempo e chegada a hora de ir embora, não se despediram. Simplesmente, saíram de mansinho, pegaram as suas coisas e sumiram. É bem verdade que esqueceram, para trás, algumas poucas coisas em cima dos móveis do quarto: um carrinho vermelho, uma bicicleta ganha numa tampinha de refrigerante e uma fotografia desbotada de uma festa junina da escola no porta-retrato. Lembranças para que você não se esqueça que um dia elas estiveram por ali. Você entra no quarto, arruma a coberta de um que está com o pé para fora dela, ajeita o travesseiro do outro, dá um beijo em cada um, puxa a cortina para o quarto ficar mais escuro e sai. Aí, você se dá conta do tempo. Aí, você se dá conta da saudade e se lembra de que há muito tempo você não precisa mais acordar às cinco da manhã para preparar o café e colocá-los na perua para levá-los à escola; que não é mais preciso sair tresloucada do trabalho para buscá-los nas aulas de natação, de judô, de capoeira, de inglês, de teatro, etc.; que há muito você na passa mais uma noite acordada por eles estarem com febre. Aquele NESCAU batido no liquidificador por exatos cinco minutos com um monte de pedras de gelo e o pão com manteiga torrado na frigideira, nem pensar. Agora já não tem mais dedos cortados por travessuras, joelhos ralados no jogo de futebol, dente quebrado no tombo do skate, gelatina diluída em água para curar dor de cabeça. Agora, você já não recebe mais telefonemas de casa no trabalho para lhe dizer que alguém prendeu outro alguém no banheiro e quebrou a fechadura, ou alguém rasgou os deveres de casa do outro, ou ainda para lhe dizer “eu te amo”. E você fica ali parada, rindo de algumas coisas, avaliando outras, percebendo o quanto você sofreu com o complexo de culpa por não ter tempo de estar mais perto dos pequeninos. Mas eles estão ali, com seus corpos e sentimentos adultos, inteiros, totalmente donos de suas experiências e vivências. Passa mais um tempo, você acorda, abre a porta do quarto das crianças e nem elas, nem os adultos estão mais lá. Seus olhos percorrem o quarto, nada saiu do lugar, o controle remoto da TV já não quebra mais, não tem mais CDs espalhados pela mesa, nenhuma roupa ou tênis jogados pelo chão, as camas arrumadas apenas aguardam tranqüilas os seus corpos cansados de viagem para uma visita. E você vai até a mesa, pega o calendário e, com uma caneta amarela, marca todos os feriados e período de férias, coloca a inicial de cada um e faz a contagem regressiva para as suas chegadas.