MÁRTIR DO COMUNISMO.
"Liu Xiaobo, durante uma entrevista em Pequim, dois dias antes de sua prisão, em dezembro de 2008.
"É preciso acreditar nas testemunhas dispostas a morrer”, dizia Pascal. Liu Xiaobo, prêmio Nobel da Paz, autor, crítico literário, pensador e dissidente chinês, foi uma delas. Na quinta-feira, julho de 2017, a Prefeitura de Shenyang, cidade onde ele estava internado em um hospital, anunciou a morte aos 61 anos do dissidente que bradou mais alto e mais claro do que todos pela democracia para a China.
O câncer de fígado diagnosticado tarde, muito tarde, no presídio onde cumpria 11 anos de prisão por “subversão” o venceu. A cadeira vazia que o representou na cerimônia de entrega do prêmio pacifista em Oslo, Nobel da Paz, em 2010, manterá seu espaço para sempre.
Resta a dúvida se o tumor não foi descoberto a tempo pelas condições médicas ruins generalizadas nas prisões chinesas ou se tratou, como suspeitam alguns dissidentes e defensores dos direitos humanos, de uma negligência voluntária para se livrar do homem que em seu julgamento em 2009 declarou “não tenho inimigos e ódio”, mas que Pequim considerava como seu principal adversário político interno.
Seja resultado voluntário ou involuntário, com sua morte o Governo chinês se livra para sempre de uma voz que, de outra forma, em três anos teria ficado livre.
Uma figura com a altura moral do Dalai Lama e a birmanesa Aung San Suu Kyi em seus anos de prisão domiciliar. Uma figura que, direta ou indiretamente, teria servido de referência para os que se opõem ao mandato do partido único, o Comunista.
Liu passou seus últimos dias no hospital universitário número um de Shenyang, no nordeste da China, para aonde foi levado após a descoberta do câncer, em 23 de maio. Nem mesmo sua agonia foi livre. A China quis silenciá-lo até o final. Pouquíssimas pessoas próximas a ele puderam visitá-lo, incluindo sua esposa, a poetisa Liu Xia, ela mesma desde 2010 em prisão domiciliar mesmo sem nunca ter sido acusada por alguma coisa.
O estabelecimento estava vigiado por forças de segurança; as habitações próximas à sua foram esvaziadas. O acesso de pessoal não autorizado estava completamente proibido. Amigos do casal foram impedidos de se aproximar, e mesmo viajar, ao hospital.
A família deixou claro que sua última vontade era receber tratamento médico no estrangeiro. Pequim recusou terminantemente. Seu argumento, de que Liu estava muito doente para ser removido. Um argumento que sustentou apesar da opinião contrária de dois médicos estrangeiros, um alemão e outro norte-americano, que obtiveram a permissão de visitar o doente em um aparente gesto conciliador. Os dois argumentaram que a evacuação era possível, mas que o tempo se esgotava.
Seus últimos dias foram cercados pela polêmica entre a China, que insistia na gravidade de seu estado e pedia a não ingerência estrangeira, e a Alemanha, cuja chanceler, Angela Merkel, implorava por “um gesto de humanidade” para deixá-lo sair. A Embaixada alemã em Pequim denunciou o vazamento proposital de vídeos da consulta com os médicos estrangeiros.
É o primeiro prêmio Nobel da Paz que morre na prisão desde 1938, quando o pacifista Carl von Ossietzky morreu no hospital encarcerado pelo regime nazista na Alemanha."
E muitos se encontram encarcerados ainda por essa ignara e nefasta ideia, que felizmente morreu aos poucos.