Diário de Bordo (O primado da irrelevância)
Diário de Bordo (O primado da irrelevância)
Nós estamos nos tornando tão vazios em em nossas interações, sejam elas profissionais ou afetivas, que sequer os nossos gritos contém substância, prescindindo Nós do necessário eco. A doença atingiu tal nível de grandeza, que pra nos fazermos presentes de alguma forma publicamos ou verbalização a primeira sandice que pula de nossas estouradas cabecinhas.
-Ah, seu João, isso é coisa de gente ignorante, dessas pessoas sem qualquer formação acadêmica, me diz o Ledo.
Ledo engano seu, meu velho e bom amigo. Há sim, una chusma de ignorantes, apedeutas de carteirinha dando pitaco sobre as mais diversas questões e enfeitando a rede com a farofa que não coube no ventilador; no entanto, é cada vez maior o número de pessoas com mestrado, até mesmo com doutorado, postando irrelevâncias as mais incríveis, que ganhariam o Oscar do gênero de barbada.
-Entonces, seu João. Nos tire dessa maré de curiosidade, antes que nos afoguemos, e nos diga por que acontece tal coisa. Me pressiona uma afogada Marocas.
-Ora, minha cara Dona Marocas. Não sou eu, um velho e assumido ermitão, o possuidor da palmatória do mundo. Mas posso assegurar, do alto desse mirante em que ora me encontro, que este oceano de superficialidade e hipocrisia em que todos estamos mergulhados é o motor e a estrada dessa doença letal que nos acomete a todos.
Passamos a viver os nossos relacionamentos como aqueles aqueles hambúrgueres servidos nas redes de fast-foods espalhadas por nossas cidades, nos deliciando com a sobremesa sabor isopor que é posta à nossa frente.
-Mas, seu João, o senhor aí nesse cu-de-mundo, aonde o vento faz a curva e o pobre Judas perdeu as botas, pouco ou nada sabe de comportamento humano, alega um crédulo Mané Paçoca.
-Gostaria muito que assim fosse, meu caro Paçoca. No entanto, aqui neste nosso microcosmo se reproduzem as mesmas mazelas que assolam os grandes centro urbanos. Por aqui, também, a Maria das Couves se anestesia de cachaça, o Zé Preá se entope de estupefacientes, e a criançada é alimentada com salgadinhos de plásticos fornecidos pela própria rede escolar em dias festivos.
E por falar em plásticos, me corta o coração e me revira as vísceras, ver as montanhas de lixo fedorento ao longo de toda a linda orla marítima dessa abençoada cidade de Ilhéus.
E pra não ficar atrás das muitas irrelevâncias escritas ou faladas, venho reclamar que essa lagartixa assanhada, a Maria Antonieta, se tomou liberdades (que eu não dei, juro!) e subiu por minha perna acima.
Pronto! Lavrei o meu impactante protesto irrelevante.