Está na moda

Podem ser apenas néscios. Podem ser apenas preconceituosos. Ou então as duas coisas juntas. Ouvir que “ser gay está na moda” está se tornando muito comum. É como se fosse a peça de roupa mais usada pela maioria das pessoas, que cai bem com qualquer idade, estatura ou estilo e eu a adquiro para me enquadrar também na moda vigente. Tão simples, não?! Certamente. Mas não é bem assim... é bem mais complexo do que imaginamos. Por um lado, a Biologia tenta explicar; por outro, a Religião; e ainda temos a própria História e a Mitologia. Sabemos apenas que nenhuma delas entra em consenso. As explicações tendem mais ser isoladas que harmonizadas.
Ser gay hoje está tão ‘em moda’ quanto na Grécia Antiga, Época Medieval, Iluminismo? Evidentemente não. Em algumas épocas, práticas homossexuais eram comuns; noutras, ilegal; e ainda em outras, culturais. Lembremos que passamos por diferentes modelos de sociedade, nos quais (na maioria delas) nosso próprio corpo e decisões pertenciam ao Estado – logo, ele definia o padrão, os valores mais ‘coerentes’, até nossas escolhas conjugais. Apenas para contextualizar como os valores sociais mudam (e que bom mudam!), o belíssimo filme “O sorriso de Mona Lisa”, lançado em 2003 e protagonizado por Julia Roberts, trata-se muito dessa questão; percebemos, por exemplo, como as escolas preparavam as estudantes para o matrimônio – meras donas de casa e cuidadoras dos filhos e maridos, mais uma peça de reprodução e ornamentação em seus lares que uma pessoa com opiniões próprias e ideais.
Para a maioria das pessoas que insistem no uso radical da expressão (‘ser gay está na moda’), vamos ver alguns exemplos que o contradizem. Em uma assembleia deliberativa na câmara dos vereadores de uma determinada cidade, cuja finalidade seria retirar termos como “ideologia de gênero” ou qualquer outra coisa que dissesse respeito à “educação sexual” do Plano Municipal de Educação, um dos argumentos que chamou a atenção do público e acarretou divisões de águas foi o seguinte: “Eu, não escolhi ser negro, já nasci assim; agora quem é homossexual o é por escolha; querem se relacionar com pessoas do mesmo sexo? Então se relacionem, mas não permito quem ensinem isso a nossas crianças.” Este foi o argumento, recebido entre vaias e aplausos, de uma pessoa que estava ali para representar toda a população daquele município. Não sei o que você acha disso, mas tal argumento soou infeliz, tendo em vista que demonstrou um desrespeito consigo mesmo (a própria cor – pois, se tivesse nascido branco teria sido melhor, mas já que nasceu preto...). Achou que estava justificando com objetividade, mas foi ainda mais subjetivo.
A gente pode escolher a profissão a exercer, a roupa a vestir, a religião a seguir, a comida a consumir, escolhemos também como nos comportar; mas não, necessariamente, escolhemos a quem amar; os sentimentos, as paixões, os desejos são relativos; não pensamos iguais, não sentimos as mesmas coisas, não nos atraímos pelas mesmas pessoas. Tudo é relativo, subjetivo, individual. Escolhemos nossos parceiros/as intuitivamente, por afinidade/identificação, por gostarmos dele/a. Ou será que você escolheu ser hétero por que está na moda? Não seja tendencioso. É a mesma condição, no entanto temos a mais ‘aceita’ e a ‘abominada’. Ah, não, ela escolheu levar uma surra do pai e ser expulsa da própria casa caso não deixasse essas coisas de ‘estar se descobrindo’ pra lá; pai e filho andando de mãos dadas e abraçados, pediram para ser agredidos em plena avenida por vândalos ‘justiceiros da moral e dos bons costumes’, achando que se tratava de uma relação homoafetiva – como se tivessem o direito de fazer isso; ou então, ser vítima de chacotas, ser tachado de “veado, macho e feme, sapatão ou bicha” deve ser considerado comum, quem mandou escolher ser assim?!. É... temos de nos habituar a vivermos com a falsa liberdade.

Ipojuca, dezembro de 2019.