MEU IRMÃO HENRIQUE

MEU IRMÃO HENRIQUE

Quando nascemos, as descobertas e a quantidade de informação que os adultos forçam o bebê a assimilar são muitas. Para esse ser que mal chegou ao mundo, todos são vultos que aos poucos ele vai reconhecendo. Ainda bebê, percebi que no meio daqueles que me rodeavam em minha nova vida havia pessoas especiais. Aos poucos essa sensação foi se aclarando e a percepção inicial se confirmou. Eu era a novidade da família e o centro das atenções. Era Paulinho pra cá, Paulinho pra lá, mas elegi quem seriam minhas referências. Com dois ou três anos, aprendi que uma das pessoas preferidas era um menino maior que me dispensava atenção e cuidados, que me ensinava e me defendia de possíveis perigos. Mal sabia que seria assim pela vida toda. Seguiram-se muitas artes e brincadeiras e, mesmo com a diferença de idades, eu tinha uma espécie de porto seguro para momentos cruciais. Com meu irmão aprendi a jogar bolas de gude, atirar com estilingue, andar de tico-tico (um velocípede pequeno), a chutar bola, andar de cavalo e muitas outras atividades. E seguiram-se mil aventuras à medida que fui crescendo.

=No Forte Itaipu, sozinhos em casa, experimentamos beber uma estranha bebida que meu avô guardava longe de nosso alcance. Meu irmão subiu numa escada, pegou o litro misterioso e colocou em um copo. Experimentamos e vimos que era horrível, como tomar uma labareda de fogo. Inconformados, pois os adultos bebiam pequenas porções daquele líquido, colocamos muito açúcar no copo e o sabor melhorou. Bebemos um copo. Do nada tudo ficou estranho, a casa começou a rodar. Eu com medo fui para trás de um sofá, meu irmão deitou no chão da sala. Meus pais nos encontraram completamente bêbados, desmaiados. Foi um desespero, pois não sabíamos o que tinha acontecido e minha mãe menos ainda. Até que ela viu a garrafa de cachaça do meu avô pela metade.

-Uma bola havia quebrado a vidraça de uma janela que ficou com um aspecto sinistro: um buraco rodeado de pontas de vidro. Coloquei a cabeça no meio das pontas e, ao retirá-la, meu queixo enganchou numa das pontas que caiu em pé diretamente em minha coxa direita. Meu irmão se desesperou e eu, calmamente, retirei o vidro e o sangue se espalhou pela cama.

-Em Santa Maria, Rio Grande do Sul, meu avô paterno colocou um cavalo a pastar no quintal de nossa casa. Inventamos de montar e passear pelo terreno, meu irmão na boleia e eu na garupa. O Henrique ainda gritou “Abaixa!”, mas não entendi. Ele abaixou e eu fiquei pendurado no arame do varal e cai de bunda no chão.

-Curti muito meus sobrinhos e na mesma ocasião que comecei a faculdade Henrique foi transferido para Canos no Rio Grande do Sul. Peguei uma carona até Curitiba. Lembro do momento que desci do seu carro na frente do Ginásio do Tarumã e nos despedimos como se não viesse a nos ver novamente. Mal sabia eu que ainda conviveríamos muito por mais cinqüenta anos. Porém a finitude é inevitável para nós, humanos. E dia 13 de dezembro de 2019 chegou o dia de uma separação mais longa. Meu irmão nos deixou. Mas viverá sempre nos corações daqueles que amou.

Meu irmão foi meu ídolo em esporte e exemplo em muitos aspectos. Inspirado por ele joguei basquete, pratiquei caça submarina, e outras atividades. E servi de inspiração para ele em outras, como cursar engenharia. Pai de família exemplar, sempre procurou ajudar a todos e terei para a eternidade gratidão por tudo que fez por mim. Adeus Francisco Henrique Miorim. Ou até breve.

Paulo Miorim, 27/12/2019

Paulo Miorim
Enviado por Paulo Miorim em 27/12/2019
Código do texto: T6827947
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