O MICO DE DONA CAMÉLIA
(Da série: Pequenas crônicas do cotidiano)
Dona Camélia era chegada a um velório.
Ficava antenada, literalmente , nas emissoras de rádio de sua cidade e com ouvido atento ao prefixo musical no serviço de auto falantes que antecedia os anúncios fúnebres na igrejinha de seu bairro.
Quando sabia de algum “passamento”, dava umas esponjadas de Cashemere Bouquet pelo rosto, vestia um traje melhorzinho e, embarcada em seu Wolkvagem TL, tomava o rumo do velório.
“ É preciso confortá a familia do finado,pra um dia os nossos familiares também serem confortados” – Essa era a sua frase de efeito.
Alegre e comunicativa, depois da seção de choros, ai meu Deus! E se conforme criatura, era ela, uma presença sempre esperada e ,se assim pode-se dizer, “animava o velório” com seus causos enquanto ,prestativa, fazia a coroa de papel crepom (sua especialidade) e ajudava a costurar a mortalha.
Onze horas de um dia qualquer.
O bar de Seo Lindomar - o esposo - estava a mil. Freguesia escorrendo pelas janelas.
Alguém no portão lhe dá a notícia de que seu afilhado, criança ainda, havia falecido.
Dona Camélia entra em pânico !
Na gritaria dispensa a freguesia de Lindomar e o convoca a “esquentar o TL” afim de seguirem para o velório.
Num assobio traz do campinho de futebol o Tininho, seu único e adulado filho à quem denominam o “Florão da casa”.
Um banho de gato em Tininho, Cashmere no rosto ligeiramente enrugado, e Lindomar, que barbeava-se, foi obrigado a seguir com meio bigode, já que a pressa da esposa não lhe deu tempo para um barbear por inteiro.
Embarcam no “ TL “ e tomam o rumo do bairro em que está sendo velada a criança.
Chegam na casa dos compadres.
Um pequeno grupo de pessoas postada ao redor da casa.
Camélia adentra apressada e chorando.
Acende uma vela, ajoelha-se e começa a rezar e encomendar a alma do afilhado.
Tininho lhe puxa a saia num sinal de que lhe deseja falar alguma coisa.
Camélia lhe dá uma cotovelada acompanhada da frase entredentes:
-Saí daí purgante ! Respeite o “anjinho”.
E recomeça a choradeira, a lamentação, as rezas...
Tininho lhe catuca e mais uma vez puxa-lhe a saia na tentativa de avisa-la de algo.
Uma vez mais a cotovelada, a promessa de uma sova quando retornarem, um cale esta boca antes que eu te arrebente aqui mesmo no velório,dentre outras amenidades do gênero.
- Respeite o anjinho ! Piá de bosta.
E assim foi por muitas vezes enquanto Camélia rezava o terço.
Até que num impulso, querendo ver pela última vez a cara do anjinho, levanta a toalhinha de crochê que encobria o suposto afilhado.
Eis que uma “Vigoreli”, cheia de adesivos surge robusta sob o crochê.
Camélia percebe , então, o mico que pagava.
Tininho vai logo lhe dizendo:
-Viu ? Eu só queria lhe avisar que o “caixãozinho” está na sala ao lado, aqui é só o quarto de costura.
Meio sem jeito, Camélia deita a Vigoreli em seu compartimento, ajeita o cabelinho e dirige-se para a sala onde realiza-se o velório.
Tininho lança-lhe um olhar de quem gostaria de dizer:
-Viu ? Danou-se teimosa.
Joel Gomes Teixeira
(Da série: Pequenas crônicas do cotidiano)
Dona Camélia era chegada a um velório.
Ficava antenada, literalmente , nas emissoras de rádio de sua cidade e com ouvido atento ao prefixo musical no serviço de auto falantes que antecedia os anúncios fúnebres na igrejinha de seu bairro.
Quando sabia de algum “passamento”, dava umas esponjadas de Cashemere Bouquet pelo rosto, vestia um traje melhorzinho e, embarcada em seu Wolkvagem TL, tomava o rumo do velório.
“ É preciso confortá a familia do finado,pra um dia os nossos familiares também serem confortados” – Essa era a sua frase de efeito.
Alegre e comunicativa, depois da seção de choros, ai meu Deus! E se conforme criatura, era ela, uma presença sempre esperada e ,se assim pode-se dizer, “animava o velório” com seus causos enquanto ,prestativa, fazia a coroa de papel crepom (sua especialidade) e ajudava a costurar a mortalha.
Onze horas de um dia qualquer.
O bar de Seo Lindomar - o esposo - estava a mil. Freguesia escorrendo pelas janelas.
Alguém no portão lhe dá a notícia de que seu afilhado, criança ainda, havia falecido.
Dona Camélia entra em pânico !
Na gritaria dispensa a freguesia de Lindomar e o convoca a “esquentar o TL” afim de seguirem para o velório.
Num assobio traz do campinho de futebol o Tininho, seu único e adulado filho à quem denominam o “Florão da casa”.
Um banho de gato em Tininho, Cashmere no rosto ligeiramente enrugado, e Lindomar, que barbeava-se, foi obrigado a seguir com meio bigode, já que a pressa da esposa não lhe deu tempo para um barbear por inteiro.
Embarcam no “ TL “ e tomam o rumo do bairro em que está sendo velada a criança.
Chegam na casa dos compadres.
Um pequeno grupo de pessoas postada ao redor da casa.
Camélia adentra apressada e chorando.
Acende uma vela, ajoelha-se e começa a rezar e encomendar a alma do afilhado.
Tininho lhe puxa a saia num sinal de que lhe deseja falar alguma coisa.
Camélia lhe dá uma cotovelada acompanhada da frase entredentes:
-Saí daí purgante ! Respeite o “anjinho”.
E recomeça a choradeira, a lamentação, as rezas...
Tininho lhe catuca e mais uma vez puxa-lhe a saia na tentativa de avisa-la de algo.
Uma vez mais a cotovelada, a promessa de uma sova quando retornarem, um cale esta boca antes que eu te arrebente aqui mesmo no velório,dentre outras amenidades do gênero.
- Respeite o anjinho ! Piá de bosta.
E assim foi por muitas vezes enquanto Camélia rezava o terço.
Até que num impulso, querendo ver pela última vez a cara do anjinho, levanta a toalhinha de crochê que encobria o suposto afilhado.
Eis que uma “Vigoreli”, cheia de adesivos surge robusta sob o crochê.
Camélia percebe , então, o mico que pagava.
Tininho vai logo lhe dizendo:
-Viu ? Eu só queria lhe avisar que o “caixãozinho” está na sala ao lado, aqui é só o quarto de costura.
Meio sem jeito, Camélia deita a Vigoreli em seu compartimento, ajeita o cabelinho e dirige-se para a sala onde realiza-se o velório.
Tininho lança-lhe um olhar de quem gostaria de dizer:
-Viu ? Danou-se teimosa.
Joel Gomes Teixeira