O tempo passa rápido
Escuto pela rua ou dentro das casas que o ano passou rápido, ontem era o começo de janeiro de 2019 e agora já estamos no fim de dezembro; que o tempo passou rápido; “passou” não é o tempo adequado do verbo, porque o tempo não para de passar. É um contínuo movimento, em que o chamado presente se torna passado, e o futuro devém presente, como se fosse uma roda que gira incessantemente. É assim o movimento da Terra em torno do Sol, fazendo a gente escrever nossos calendários, marcar o mês, cheio de dias que formam semanas, até se atingir o fim de dezembro, que logo está chegando. O fim do ano se aproximou depressa do começo de um novo ano, circunstância em que a gente recebe ou compra um novo calendário, jogando fora o velho, todo riscado, com certas datas marcadas, sejam de aniversários, sejam de outros compromissos e afazeres como o do dia da feira, de ir ao médico ou de comprar o gás. E tudo quase vai se repetir. O que pode ser diferente, mas muitas atividades dão velocidade ao tempo, contudo nunca haverá dia completamente vazio, pelo menos cheio de vida, porque o tempo tem uma correlação com a vida; às vezes, muito estreita, é quando o tempo se identifica com a vida. Chegaria a dizer: tempo é vida. Sem vida, não observaremos o tempo passar, tudo será escuro...
Sim, é verdade, há muita coincidência entre a vida e o tempo, do que se conclui: ninguém viveu fora da sua contemporaneidade, você viverá sempre dentro do seu tempo. E se você é contemporâneo, você é primeiramente contemporâneo de si mesmo. Como se estivéssemos viajando todos num mesmo trem, ou seja: somos passageiros de um mesmo trem ou vivos num mesmo tempo. Nunca vi comparação tão adequada como a de que, ao estar na janela do trem, observo as paisagens que passam, que ficam para trás, coisas paradas ou em movimento, indivíduos arando o campo, casas, bois, bodes e carros de boi, açudes, mas que ficam para trás como virassem passado. As que vejo agora seriam o presente; e as que ainda viriam a ser vistas, o futuro. A sua visão varia, de acordo com a velocidade do trem. E quanto mais veloz é o trem, mais rapidamente passarão as paisagens. E mesmo que você saia da janela, você sente que o trem está em movimento, isto é, o tempo passa porque, ainda que de olhos fechados, você está consciente e vivo.
Nessa viagem, não há chegada, a não ser na estação da morte, quando o trem para e não acontecem paisagens, tudo é escuro, como o trem estivesse dentro de um túnel sem luz. Portanto, como diz Guimarães Rosa: “O importante não é chegar e nem partir, é a travessia”. Afinal, nós nos enchemos de atribuições, dentro desse trem, e, por isso, saímos da janela, depois para voltar à janela e sentir que muitas coisas deixamos de ver. É também quando afirmamos que o trem teria aumentado sua velocidade, porque perdemos de vivenciar muitas experiências. É no sentido de se desprender do excesso de atividades que existe o provérbio: Carpe diem! Aproveite o dia, desfrute daquilo que pode tornar sua jornada feliz.
É simples a Filosofia Antiga definir que o tempo é o que acontece entre um “antes” e um “depois”; que ele é um período entre um anterior e um posterior. Nesse aspecto, Bergson é mais esclarecedor e realista, distinguindo o que se estabelece como sendo durée, a duração da nossa consciência e da nossa experiência, contrapondo-as ao tempo, enquanto “realidade abstrata”; tão abstrata que não se mostra materialmente como coisa tangível. Ninguém pega o tempo, ele é eternamente fugitivo. É como não existisse, pergunto-me até para as pedras se o tempo existe; elas permanecem mudas. Por isso, as pedras não reclamam que “o tempo passa rápido”.