Talher

Habitualmente almoço num restaurante daqui da cidade chamado “Restaurante Popular”. É um restaurante da iniciativa pública, no qual o café e almoço saem a um valor simbólico. Bom, estava eu ontem, quarta-feira, na fila para comprar o ticket e almoçar, como muita gente que lá se alimenta... Era horário de pico, as filas para a compra do ticket e busca do bandejão estavam cheias.

Bem, aí eu e minha pouca paciência conversávamos com a ansiedade que me levava a pensar que não daria tempo de cumprir os demais afazeres do dia. Tudo a passos lentos: a fila, o atendimento, a galera que comia e até os minutos, o que era ótimo. Quando enfim comprei meu ticket e me encaminhei para uma das filas de alimentação, caminhava um senhor à minha frente, desde o ticket. Passinhos despreocupados e muito vagarosos, ele andava tranquilo como se fosse o único na fila. Enquanto isso me subia o desespero da pressa, mas eu não passaria à frente.

Cada um de nós pegou uma bandeja e um prato, e iniciamos o circuito: arroz e feijão, frango grelhado, as saladas de couve com tomate e cenoura com repolho, um potinho de arroz doce como sobremesa, o fatídico suco aguado. Eu ainda o seguia como procissão, já em ponto de surto com seu tempo de fazer as coisas; sentia inclusive a minha respiração ficar grave.

Faltava apenas pegar a embalagem na qual garfo, face e colher ficam em conjunto, e poderia avançar aos temperos no meu tempo, sem pisar os passos daquele senhor. Ele então parou de frente à caixa em que os talheres ficam armazenados, olhando para muitos conjuntos ali, como se buscasse algum em especial, escolhendo o conjunto que mais fosse de seu agrado. O pior: todos os conjuntos são igual, tanto faz o que pegar, penava comigo. O velho então enfiou a mão na caixa e retirou dois conjuntos, virou-se para trás e colocou um dos jogos de talheres em minha bandeja. Para já te ajudar, ele me disse sorridente. Me desarmei inteiro, só consegui sorrir de volta e agradecer.

O velhinho se voltou para frente e caminhou, mais uma vez a seu tempo. Então eu decidi seguir o coroa, quem sabe eu não aprenderia mais sobre paciência...

Crônicas de um Ignorante
Enviado por Crônicas de um Ignorante em 09/12/2019
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