Laranjal: crônica de um amor antigo*
Eu nem lembro quando o conheci. Mas foi na época em que eu era bem pequeno – ainda sou, mas era mais ainda. A lembrança mais antiga mesmo era de quando a gente ia acampar nas férias, lá no Totó. Pra mim, o Laranjal era o Totó e o Barro Duro, eu não conhecia bem o Santo Antônio e o Valverde.
Os meus pais ainda eram casados, isso era na metade dos anos 1980, e a gente passava uma ou duas semanas acampados na praia. Eu não tinha muita noção de tempo, afinal era criança. Muita gente acampava lá no Totó, que ainda não era uma reserva ambiental protegida. Ou era, mas ainda podia acampar no local, inclusive tinha um senhor que morava lá. Eu não sabia o nome dele, chamavam de Tarzan.
O primeiro acampamento aconteceu antes de eu começar a estudar na Escola Sagrado Coração de Jesus, em 1986. Mas, também acampamos em 87, 88, 89 e por aí vai. Meus avôs paternos também iam, e a minha tia materna. Então tinha a parceria do meu primo Leandro, apelidado de Nozinho – porque é filho do Nó Cego – depois ficou conhecido como Palito. O Tiago, irmão do Palito, ou Nozinho, nasceu naquela época, 87 ou 88, era pequeno ainda e não participava das pescarias que a gente fazia nos acampamentos do Totó.
Os acampamentos ficaram mais técnicos depois que eu e o Palito entramos para os Escoteiros, no grupo Itaipú. Aprendemos técnicas de escotismo, a coisa ficou séria, inclusive ganhamos as nossas próprias barracas de três lugares. Imagina que maravilha. O último acampamento no Totó foi no final de 1994, ou início de 1995. Como meu avô paterno tinha falecido em abril daquele ano, os acampamentos familiares já não tinham a mesma graça. Além disso, os meus pais tinham se separado e, meu pai foi morar no Balneário dos Prazeres – nome sugestivo para o nosso amado Barro Duro – logo não era preciso acampar para curtir o Laranjal.
Foi lá que vi meu pai construir uma cabana com um amigo da família, o Irineu. Vi uma guria, amiga de veraneio, não lembro se era Flávia ou Patrícia o nome dela, enfim, ser mordida por um cão pastor alemão. Uma coisa chocante. Numa dessas férias na praia – por falar nisso, férias para mim é sinônimo de praia(!), não sei para vocês – ganhei uma medalha declamando uns versos num festival qualquer que aconteceu certa vez.
Como escrevi antes, no final dos anos 80 entramos para os escoteiros, e muitas vezes fomos acampar na praia. Inclusive no Camping Municipal, que era massa! Depois virou Ecocamping, foi no governo Marroni (2001-2004). Ele ficou sob os cuidados da Secretaria de Qualidade Ambiental – que foi criada na gestão petista. Inclusive, eu não entendia porque não colocaram o nome de Secretaria do Meio Ambiente, como era comum em todas as cidades onde tinha um órgão com a atribuição de proteger o ambiente local. Pois o primeiro secretário titular da pasta, o advogado ambientalista e ex-militante do DCE-UFPel, Alexandre Melo, me explicou: meio e ambiente expressam a mesma coisa, Secretaria de Meio Ambiente é uma redundância. Portanto, optaram por Secretaria de Qualidade Ambiental e ficou jóia. Inclusive eu trabalhei nela um tempo, mas isso é outra história...
Outra atividade muito agradável era ir na praça Aratiba, a noite, quando sempre aparecia um parque itinerante com vários jogos para divertir o povo – não sei se ele ainda aparece lá. Mas, o melhor era o bar do Costinha que está em plena atividade, mas sob nova direção, pois o homem já é finado. Onde sempre tinha uma máquina de fliperama, para eu e o primo jogar um Street Fighter. Inclusive, a gente sempre dava um pulo na praça Aratiba assistir o clássico de futebol local aos domingos a tarde Aratiba versus Ideal. E, junto da gente ia o nosso cusco de estimação, o Araquem, que viveu mais de quinze anos!
Todas essas recordações e outras tantas voltam a minha mente sempre que chego no Laranjal. Hoje freqüento mais o Santo Antônio e o Valverde e fico um pouco triste ao ver que a nossa amada praia não está tão bem cuidada pelo poder público. Ruas esburacadas e alagadas. Sujeira na beira da lagoa. Será que a nossa prefeita não tem uma história afetiva com o Laranjal, eu me pergunto?? Pois, eu penso, que se tivesse, certamente cuidaria mais dele. Afinal, diz a sabedoria popular que, quem ama cuida. Uma coisa é certa, o meu amor pelo Laranjal é antigo.
Daniel Lemos é professor e membro do Conselho Editorial da Revista Crítica Marxista.
* Publicado no site "Outras Vozes. Coletivo. Livre. Plural" em 11 de fevereiro de 2019.