O velho sábio. O paciente virou mestre.

Depois daquele dia ficamos amigos. Era um paciente nos seus 91 anos, que depois de atende-lo fiz a pergunta que sempre faço para aquelas pessoas que mesmo com a idade cronológica adiantada, conseguem manter uma surpreendente lucidez.

-Agora Sr. Alfredo, o senhor vai me receitar.

Com um sorriso e um sotaque forte Italiano respondeu:

-Como eu receitar, sou um velho com tantas limitações.

-Olha pois te digo que sua capacidade e sabedoria é maior que muitos jovens. Retruquei.

Alfredo deu um sorriso, demonstrando felicidade pelo elogio.

-Mas, Wilson, o que você quer saber?

Vou te perguntar alguns conceitos, e você pode responder em poucas palavras.

Após ver que com um gesto balançando a cabeça, ele concordou com a "regra" estabelecida por mim nessa breve entrevista. Perguntei:

-O que é Felicidade?

-Ora, felicidade é a paz da alma.; O homem para ser feliz precisa se ver por dentro, se entender, se gostar.

-Como assim?

Mesmo após dizer que queria objetividade nas respostas resolvi extrair mais um complemento. Meu amigo não se esquivou.

-Olha, para ser feliz é preciso fazer outras pessoas felizes, saber conviver, mas como alguém pode fazer outro feliz se não estiver com a alma em paz?

Bela observação. Agora fui em outro tema. Perguntei:

O que é a morte para você?

Sem muita demora, levantou seu olhar em minha direção disse:

-A morte é uma passagem do precário para o definitivo. Onde todos terão que um dia passar, em direção ao juízo final.

Existe justiça nesse julgamento? Indaguei. Pois se cada ser humano em sua complexidade nasce em diferentes classes sociais.

-Saiba , Wilson.

Respirou fundo e veio com uma emblemática frase.

-O que salva o homem, o que diferencia não é a classe social, o meio que vive, ou a cultura.

Emendou:

-O QUE SALVA O HOMEM É A FÉ EM DEUS. A FÉ É O INSTRUMENTO DA SALVAÇÃO.

Achei interessante a resposta, mas logo emendei outra pergunta. Agora bem pessoal.

-Alfredo, meu prezado, você guarda algum arrependimento na vida?

-Nenhum arrependimento, porque se assim falamos temos que entender as circunstâncias que aquele momento tivemos tal atitude. A vida tem que ser vista como um dia após o outro, sem arrependimentos, pois o ser humano é livre para fazer suas escolhas, o que temos que fazer é aproveitar ao máximo nossa passagem por aqui, para aprendermos com nossos erros.

-Sendo assim você já errou?

-Claro que sim.. Quem não erra? E saiba muitas vezes aprendemos mais com os fracassos do que com os êxitos.

Reflexivas sempre suas colocações, sempre passando conhecimento, mas com o passar do tempo não quis que meu amigo, se esgotasse.

Despedi-me e o ajudei a pegar sua bengala, mas notei um ar mais animado, um semblante de quem se sentiu bem em conversar.

Ainda em um questionamento ele me perguntou:

-Wilson, estou me sentindo melhor, você acha que devo voltar a dirigir?

Sempre fui bom motorista e estou pensando em voltar. Aprumei o corpo.O que você acha?

Vejam que responsabilidade a minha. Reergui até a auto estima do amigo, paciente, Alfredo.

-Olha meu amigo, hoje está muito complicado dirigir, até eu mesmo se pudesse não pegava em carro. Deixa isso pra lá.

Concordando comigo, mas sem muita convicção, balançou a cabeça em sinal de positivo e saiu com seus passos lentos e firmes...