UM CONFABULAR

Quando ainda estudante pré-vestibulando, ao varar noites lendo aquelas cansativas obras literárias que seriam cobradas nas provas dos vestibulares, eu sempre perguntava: Deus, o que leva uma criatura a dedicar uma vida inteira a escrever, escrever, incansavelmente escrever... Imaginava então as dificuldades que aqueles abnegados, os autores, haveriam de superar, até a consagração do momento final em que aquelas pérolas literárias viessem à luz.

Hoje, com o incremento de todo o aparato tecnológico a saga do escritor tornou-se amena. Não que a tecnologia tenha escanteado a mente, o talento humano na produção de obras no campo literário, mas o computador, por exemplo, inegavelmente tornou-se um aparato espetacular de suporte àqueles que, quer profissional ou amadoramente trilham os caminhos árduos, mas dignificantes das letras.

Vivemos a febre dos blogs, dos espaços literários, dos recantos literários que oportunizam aos novos talentos, divulgarem os seus trabalhos literários. E como há pérolas emergindo nesse campo! Trabalhos eloqüentes de sabedorias, de sonhos, lições, idéias e concepções de vida. Idéias fenomenais, muitas que parecem aflorar sutilmente nos versos, nas rimas, no contexto maior.

Estão lá os escritores saudosistas, que ainda teimam em falar de estrelas, de saudades, de desejos, de amores, de paixão. Estão lá os que nos contam historias de amor, tão caprichosamente decantadas, que parecem nos transportar aos céus e aí somos tomados de desejos, talvez os mesmos de Ìcaro.

Estão lá os escritores melindrosos, concisos, reservados; mas estão também os loucos desvalidos a bradarem por uma nova ordem social; estão os que chacoalham e debocham das verdades tidas como absolutas; os que agridem, os que transgridem. Estão lá os anti-socialistas, os budistas, os xiitas, hereges, ateus, crentes, descrentes, todos fincando suas bandeiras no solo fértil do campo literário.

Talvez nós, os chamados escritores amadores, ao produzirmos nossos trabalhos, sequer imaginamos a responsabilidade que chamamos para nós, no exato momento em que postamos nossas idéias. Os aplausos, os elogios que por ventura nos chegam são importantes e incentivadores, mesmo que não tenhamos quaisquer outros objetivos a não ser o prazer de escrever. Mas o que nos dignifica, de fato é imaginarmos que podemos sonhar; podemos acalentar o espírito; ninar; acordar desejos. Quiçá, até podemos levar palavras de conforto e alento para alguém que está lá no outro extremo, mas que nos acompanha em surdina, mesmo que esporadicamente. Temos também, por conseguinte, um papel significativo no contexto social.

Muito já se falou sobre o ato de escrever. Há uma infinidade de concepções: um prazer, um devaneio louco, aguerrido, lúdico, uma necessidade, um enlevo maior. Eu diria: escrever transcende trivialidades. É um momento impar, é um confabular da mente versus espírito, é o insuflar a imaginação. Talvez um desejo de voar, voar e voar.

eduardo.conde@uol.com.br

Eduardo Conde
Enviado por Eduardo Conde em 18/11/2019
Código do texto: T6797556
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