MEU PASSADO ME CONDENA

Minha prima me liga – estou te convidando para as nossas bodas de ouro no dia 27 de abril. Vamos fazer um almoço.

- Legal prima. 50 anos de casada, quanto tempo heim?

- Não lembras. Estavas no casamento.

- Claro que lembro prima.

- Foi no dia do teu aniversário. Dia 26 de abril de 1969. Completavas 11 anos.

- É mesmo?

- Claro! Vamos fazer a festa dia 27, porque 26 cai na sexta.

Olha só. Minha parente lembrando do meu passado, com mais detalhes sobre mim do que eu mesmo.

Há alguns meses fui a Três Passos, minha terra. Numa confraternização encontrei velhos amigos. Um deles, bom de cabeça e de histórias, contou uma minha sobre o tempo de ginásio. Sou desse tempo.

Dizia ele que o professor Clemente, que lecionava contabilidade, ditava a matéria enquanto os alunos anotavam. Eu, muito interessado sentava na primeira fila. O mestre ditava e andava de um lado para o outro espiando vagamente às anotações dos alunos. Viu a minha letra e se impressionou.

-O que é isso aluno. Que garranchos são esses?

Eu, assustado nem falei. Fiquei mudo.

Voltou ao ditado, repassou um parágrafo, umas 10 linhas e repentinamente voltou-se para mim dando a ordem:

- Leia agora o que escreveste!

E eu, tranquilamente, comecei a ler o ditado anotado de forma normal sem titubear.

- Só tu para leres esses garranchos!

Pois então. Eu não lembrava dessa minha passagem. É assim. De vez em quando descobrimos que amigos e parentes, sabem mais do nosso passado do que a gente mesmo.

No meu caso, meu passado me condena. Pela idade e pela letra feia

JORGE BLEDOW
Enviado por JORGE BLEDOW em 17/11/2019
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