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Dessa vez, eu não desistirei no meio do caminho. Não deixarei meu lúgubre cérebro pausar meu ideal, minha cusparada imaginativa e criativa de desilusões. Não travarei a língua como quem trava a catapulta antes da guerra, como quem espera o momento exato de tacar a pedra e ao fazê-lo percebe que as amarras estão frouxas. Não. Hoje não é dia de parar, nem amanhã, nem qualquer outra sétima parte da semana, nem qualquer momento do qual tique-taca o relógio, nenhuma hora é a hora certa de freiar o carro da intensidade, o arco-íris de conhecimentos que em mim residem, sejam eles úteis ou não. Ainda quero falar dos amores que vivencio em minha mente e meu coração, preciso despejar esses resquícios de borboletas que cozinham no ácido do meu estômago enquanto relutantemente as engulo, porque o mundo é iluminado - e isto é negativo pois na obscuridade que se conhece a grande realidade das coisas. Ainda quero falar das traições mais graves que as passionais, reles comunicados de instabilidade emocional, que nada se comparam às verdadeiras puxadas de tapete: as palavras mal ditas, as dores apertadas no fundo da alma que são deixadas paradas, como panos encharcados que levam dias para secar e pingam lentamente. Não pararei agora, ainda tenho que cantar a beleza do que se esconde nos cantos escuros, dos beijos roubados, das malícias da juventude e das experiências dos velhos, das cândidas crianças e dos homens e mulheres que, despidos de melhores ideias, decidem que viver a mesma estupidez dia após dia é o mais coerente com seu potencial. Não sou diferente, eu e meu sorriso apagado e torto, não sou nada a mais nem nada a menos, mas quem me impede de observar? Essas mãos - que, inclusive, hoje acordaram formigando - ainda têm de servir como catalisadoras de ideias, embora nem sempre boas, nem sempre belas, são minhas.

Sinceramente, ao me debruçar aqui, desejava ter expelido um poema repleto de palavras complexas e jogos de ideias, porém, há tanto tempo que não faço isso que perdi os calos dos dedos e o calor das ideias. Em suma: continuarei tentando. Se é murro em ponta de faca ou retorno de uma grande jornada, só farei ideia daqui algum tempo, olhando para trás, pensando "que bobeira!" ou, então... "eu consegui".