Crônicas da Amendoeira ( Gerundiando por aí )
A época da ditadura militar não ficou conhecida apenas por suas atrocidades físicas e aversão ao povo. Foi também a Era das Boçalidades. Militares e lacaios - alguns dos quais ainda vivos -, vomitavam suas aberrações mentais com uma arrogância que beirava o patético. É dessa época o meu desprezo por tudo aquilo que o ufanismo reinante chamava orgulhosamente de espírito patriótico.
Minha escola ginasial foi um laboratório que acumulou experiências de resultados catastróficos. Minhas aulas de Educação Moral e Cívica foram ministradas por uma balzaquiana que nos obrigava a decorar hinos idiotas, bandeiras, símbolos e heróis nacionais de moral duvidosa. Creio que a lavagem cerebral só não funcionou em mim porque eu tinha um lar que ainda chamava para si a arte de educar e que abrigava um irmão vermelho e um pai que costumava se referir aos militares carinhosamente como gorilas. Com toda certeza, vem dessa época também minha aversão pela burrice diplomada e meu apreço pelo Barão de Itararé, para quem o diploma não encurta a orelha de ninguém. Tive um professor de matemática que sentia orgulho em dizer que nunca lera um livro que não fosse técnico.
Pelas mãos de meu irmão fui apresentado ao livro FEBEAPA ( Festival de Besteiras que Assola o País ) do Stanislaw Ponte Preta, o querido Sérgio Porto, que nos brindava com as pérolas que eram ditas pelos quatro cantos do país. Lembro-me do caso de um prefeito não sei de onde que, aconselhado a não realizar uma obra por que ela esbarrava na Lei da Gravidade, chegara a pedir, junto à Câmara de Vereadores, sua imediata revogação já que a obra era um clamor popular. E de um outro que, por telegrama, perguntava a um colega de um município próximo sobre a passagem do equinócio, obtendo como resposta que o Sr Equinócio ainda não havia passado, mas assim que o fizesse seria recebido com banda e fogos de artifício.
Escrevi tudo isso para estar tentando relativizar o escândalo causado pelo decreto do governador do Distrito Federal que demitiu o gerúndio. Talvez estejamos fazendo uma tempestade em copo d'água. Mas, das duas uma: ou o ilustre cavalheiro é chegado à galhofa - e os ares de Brasília sempre foram propícios a isso -, ou é uma dessas bestas jactantes que namoram o passado. Só não aceito o "gerundismo" como desculpas. Os vícios de linguagem não são uma alternativa para o modo de falar ou escrever. São erros, e assim devem ser mostrados. No entanto, seja como for, o gerúndio pode suscitar situações embaraçosas. Tenho uma amiga que separou-se do marido exatamente por isso. Depois de tantas tentativas em corrigir os erros que ele teimava repetir, finalmente desabou:
- Detesto homens que têm gerúndio no nome!
Chamava-se Armando.