"SÃO PAULO IN"

A ideia inicial era apenas levá-los até o hotel que estavam hospedados no centro da cidade, passando por alguns pontos turísticos como o bairro da Liberdade, a igreja da Sé, o solar da marquesa, entre outros.

Ao longo da grande avenida que liga as regiões Sul e Norte, fui mostrando alguns locais. Aeroporto de Congonhas, memorial erguido em frente, avenida dos Bandeirantes, sempre congestionada. Quando chegou próximo ao Ibirapuera, disse-lhes:

- Olha, aqui é o parque do Ibirapuera, estão vendo?

- E o ginásio onde foi disputado o Brasil open? perguntaram

- Vocês não conhecem... infelizmente passei da saída de acesso... me desculpem, estava com sono, foi um dia cansativo, não foi?

-Tudo bem, tá bom. disseram

Mas logo à frente, havia uma saída, uma alça de acesso ao viaduto Tutóia, local em que existiu um enorme navio ou barco em tamanho real, onde funcionou a danceteria Latitude 2.000, na qual aconteciam muitos shows , inclusive o de uma cantora alemã de Berlim chamada Nina Hagen, trazida pelo roqueiro Supla, que havia sido mencionado na conversa da tarde. Mesmo assim, o casal teve que se contentar em apenas ter visto os fundos do vestuto ginásio.

Passamos em frente ao círculo militar, saindo em frente ao lago do Ibirapuera onde começava o grande espetáculo da fonte luminosa e suas águas dançantes ao som de música clássica e outros ritmos. Seu entorno já estava tomado. Defronte ao lindo lago, na avenida Pedro Álvares Cabral vimos o palácio Nove de Julho em que funciona a assembleia legislativa do estado, prédio recém reformado - prédios públicos da cidade são sempre reformados- e com uma nova iluminação royal.

A cidade de São Paulo é muito rica em monumentos e arquitetura. Logo à frente,na imensa ilha cercada por carros, o grandioso monumento às Bandeiras, de Victor Brecheret, apontando sempre e eternamente para o ponto cardeal Norte, caminho nem sempre seguro às Bandeiras. Seguimos avante até a igreja nossa senhora do Brasil e entramos à direita para subir a famosa rua Augusta.

Paramos ao lado do clube Athético Paulistano e caminhamos até a galeria dos pães. Apontei o 78ºDP e disse que delegacia de polícia parecia ponto turístico, curioso, pois em qualquer cidade que se vá as pessoas dizem: “olha aqui é a delegacia. Passamos ainda pelos 4º e 1º DP.

Entramos na elegante padaria e eles estranharam a fila cheia que subia a escada de madeira em forma de caracol; “É a fila da sopa”, disse a funcionária. Tomamos café, o marido da Cris comprou um chocolate e fomos ver vitrines por algumas ruas dos Jardins. A Bela Cintra, Haddock Lobo, a Oscar Freire, muitas lojas, bares, restaurantes famosos, charutaria cara. Continuamos subindo a Augusta, desse lado do espigão era isso, disse-lhes, teatro Procópio Ferreira aqui, outra adiante. Cimeiro o Dante e o Renaissance, nas alamedas Jaú e Santos, respectivamente. As procuradoras do “ parquet” federal e sua vasta biblioteca, a Lina Bardi e o conjunto nacional.

Depois de atravessar a av. Paulista, sentido centro, acontece muita agitação e eventos, principalmente quando anoitece. Há muitos jovens, cinemas, estudantes, grupos, casais, descolados, tendências do espírito de época, muitos bares, clubes, escritores, executivos, bancos, espaços culturais, mulheres bonitas, artistas, músicas perfeitas, salão de Odete e Fátima, neón da boates, região do baixo Augusta.

Era cedo ainda e não tivemos trânsito. Apontei-lhes a praça Roosevelt, que estava em reforma, fechada por tapumes, sendo arrumada, parecendo uma noiva vista do céu por e muitas Marias e do alto do triângulo central por egrégios padrinhos, fiéis mosqueteiros, loros azuis, canários amarelos, jandaias verdes, labasques, lulus, palhacinhos, pombinhas, bibis dourados, pacaembús, carequinhas, gaviões e pardais, linda noiva à espera do varão circense cujo nome assumirá.

Escultura, chafariz de fogo e água, iluminação da Avanhandava e seus belos restaurantes, talheres, massas, torres distantes, charutos, bares, linhas, picanha de tharso com batata e mel. Luas, janelas e planetas, frestas de lembranças inextinguíveis. Os três brincos de Cléo. Meninas dos olhos da metrópole.

Contei-lhes que o último jantar do dramaturgo Dias Gomes havia sido feito naquele restaurante que passávamos em frente. Após a ceia, pegou um táxi branco e morreu no acidente de trânsito, cinco mil metros depois, na avenida Nove de Julho. Outro escritor e dramaturgo que fazia frequentemente refeições por ali era o impagável Plínio Marcos. Certa ocasião, ele jantava no Gigetto quando se aproximou um rapaz que disse-lhe:

-Plínio Marcos quero trocar umas ideias com você.

Ao que Plínio, sem levantar a cabeça, falou com sua voz peculiar:

- Não obrigado, estou muito bem com as minhas.

Crhis e Samuel sorriram. A verdade é que estava gostando de mostrar-lhes a cidade e contar algumas de suas histórias, como uma da marquesa de Santos. Após passearmos pela Liberdade, ao lado da rua conde de Sarzedas, ao lado do fórum da praça João Mendes, entramos na antiquíssima rua onde ela morou depois que voltou do Rio de Janeiro. Domitila de Castro era moça namoradeira e casou-se bem nova com um alferes mineiro que servia em São Paulo. Ela teve um romance com o filho do conde de Sarzedas e teve a perna esfaqueada pelo alferes. Foi um escândalo à época. Separou-se do marido ciumento e logo depois viria a conhecer Dom Pedro.

Chris parecia encantada com o passeio, lugares e histórias da cidade. Quando falei em João Ramalho, ela disse:

-Meu sobrenome de solteira é Ramalho.

E não é. João Ramalho é considerado o patriarca dos paulistas. Não se sabe ao certo se ele era degregado ou náufrago, mas surgiu no litoral de Santos em 1512 ou 1514. No ano de 1932, fundou a cidade de Santo André da Borda do Campo. Em 1560, por ordem do governador-geral, houve a união das cidades de Santo André e São Paulo, esta fundada em 1554 pelos três padres jesuítas. Ramalho, a contragosto do padre Brás, casou-se com Bartira, filha do cacique Tibiriça, e foi protetor da cidade.

Antes de deixá-los do outro lado da colina, no São Paulo Inn, hotel ao lado do viaduto Santa Efigênia, rondamos novamente a Avanhandava para jantar. Os restaurantes da família Mancine tinham espera de pelo menos uma hora, mas eu conhecia uma das recepcionistas e ela logo nos acomodou em um dos agradáveis ambiente.

Vinho, decoração mediterrânea, tons pastéis, discos, balões de gás, lançados ao céu pelos pizzaiolos, pessoas jantando e se confraternizando e ao piano uma linda música italiana do Johnny Dorelli tornaram aquilo que começou como uma simples carona um passeio inesquecível .

Parla piú piano

Fale mais baixinho

E nessuno sentirá

Ninguém nos ouvirá

Il nostro amore lo viviamo io e te

O nosso amor vivemos eu e você

Nessuno sa la verita

Ninguém sabe a verdade

Neppure il cieloche ci guarda da lassú

Nem o céu que nos olha lá de cima

Parla piú piano

Fale mais baixinho

E nessuno sentirá

E ninguém nos ouvira

Quero sentir

Gliu occhio miei dentro de ti

Meus olhos dentro de você

È um grande amore

É um grande amor

E mai piú grande existerá

E nunca maior existirá.

FIM

Marcos Pessoa
Enviado por Marcos Pessoa em 06/11/2019
Reeditado em 14/11/2019
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