A casa do bosque de eucaliptos
A casa do bosque de eucaliiptos
A casa em que fomos morar, em São José dos Campos, cidade do interior do estado de São Paulo, tinha um pé de fruta-do-conde montando guarda na frente e um pelotão de bananeiras no pequeno quintal que havia nos fundos. Possuía um quarto a mais do que a residência anterior, na mesma rua, da qual havíamos acabado de nos mudar. Fazia parte de um agradável conjunto residencial projetado para atender o crescimento da cidade no final da década de setenta do século vinte; uma rua inteira com um lado todo construído de casas homogêneas, de dois e três quartos, todas elas tendo um bosque de eucaliptos a oferecer-lhes uma sombra e perfume muito agradáveis.
Nessa época eu trabalhava numa grande empresa siderúrgica, viajando por todo o vale do rio Paraíba do Sul a oferecer os seus produtos, função que me permitia bancar os custos de manter um padrão de vida de boa qualidade para mim é minha jovem família.
Logo que fizemos a nossa mudança, minha mulher me perguntou se eu havia notado a presença de uma pequena mulher negra perto da porta de entrada da casa, a observar a nossa movimentação. Mais preocupado com a azáfama própria de acomodar as coisas na nova casa, não prestei muita atenção ao que a minha mulher, na época contando vinte anos, me relatou...
(...)
Os dias foram se passando e eu continuei mergulhado em minha rotina profissional, ficando um ou dois dias fora de casa a trabalho, e retornando para desfrutar da companhia da minha jovem mulher e do meu primeiro filho, com pouco mais de um ano de vida.
Tudo parecia correr na mais perfeita normalidade: uma casa aconchegante, uma família linda se constituindo, um belo trabalho, e nossa juventude sendo vivida num cenário idílico.
Eis que eu retornei para casa de mais uma viagem de negócios. Era uma sexta-feira do mês de Outubro de 1980.
Como sempre, a minha mulher veio me rever com a amorosidade característica, me abraçando e me colocando aquele garotinho lindo e loiro para que eu o sentisse junto de mim. No entanto, assim que eu entrei em casa, ela voltou a falar na pequena mulher negra, aquela que havia nos recepcionado em nossa mudança.
"Eu a vi de novo, Bosco. Ela estava no mesmo lugar da primeira vez."
"Eu estou com muito medo!" "Não sei o que ela quer." Disse-me ela com os grandes olhos verdes muito abertos e cheios de medo.
(...)
Certo. Não tive outra saída, a não ser me desligar das preocupações com as demandas de meu trabalho e dar A devida atenção ao relato apavorado de minha mulher.
"Fique calma, e me descreva a mulher que você viu."
"Ela é bem baixinha, preta retinta, tem um lenço na cabeça com os cabelos crespos aparecendo..." "Eu não estou ficando louca, pois você também a viu quando fazíamos a mudança."
Refleti a respeito do que a minha mulher estava me falando, e, na racionalidade tipicamente aquariana que me é peculiar, continuei fazendo mais questionamentos.
"Ela fala alguma coisa?"
"Faz algum gesto que lhe amedronta?"
"Não." "Ela não fala nada. Só fica quieta no canto da porta de entrada."
"Mas eu sei que ela não é daqui.""
"Eu quero que ela deixe a nossa casa e vá embora, Bosco."
(...)
Prometi para a minha jovem mulher que eu daria um jeito na situação, pois de maneira nenhuma eu queria mudar de casa, haja visto que morar ali era muito prazeroso.
Pra resolver o dilema da pequena mulher negra, me pus a conversar com ela; sozinho, é claro, já que minha mulher morria de medo dela.
Como resultado dessas conversas nada ortodoxas, depois de alguns dias a pequena mulher negra foi embora de nossa casa e nos deixou em paz.
Depois da partida de nossa silenciosa visitante, eu procurei reforçar a coragem da minha mulher para que ela fizesse frente a eventos semelhantes, na possibilidade de que pudessem vir a ocorrer outra vez.