UM POUCO DO BRASIL – DO BRASIL PROFUNDO
(Artigo publicado em 20/10/2019 no Folhetim de Barrocas - FB. As ideias aqui expressas são de responsabilidade exclusiva do autor)
A noite era perfeita e os ares tropicais com sua brisa atlântica suave nos conduziam para um passeio pela metrópole. Salvador tem esse encanto alegre e que nos convida para o encontro, sempre sorridente à nossa espera. Alegria e felicidade é a fórmula mágica dessa cidade. E a lua em silêncio gritava sua beleza plena e avermelhada, pairando sobre o horizonte de Itapuã. A lua era enorme e como um farol iria nos guiar pelos becos e ladeiras da nossa aventura.
Escolhemos um espaço aberto, acolhedor para sentarmos. As pessoas, todas, alegres e falantes completavam o charme daquele lugar. O garçom, um senhor já maduro, próximo dos seus sessenta nos atendeu com muita gentileza e sempre com um sorriso largo no rosto. A sua camisa florida com tons caribenhos e baianos completavam a cena do lugar. Pedimos algo para petiscar e duas bebidas. Claro, antes de fecharmos o pedido tínhamos consultado o “Menu”, diz-se [m′enju:], ainda não entendo por que não escrever “cardápio”. O petisco tinha o valor de R$ 65,00 e as duas bebidas R$ 10,00.
Logo em seguida, emprestamos uma parte da mesa para uma vendedora apoiar sua vasilha de caldo. Era uma jovem muito simpática, decidida, dinâmica e rápida nos seus atendimentos. A sua segurança e cordialidade demonstravam que mesmo ainda nova já tinha muita experiência no ramo de vendas. Ela nos contou que preferia viajar por mais de uma hora, pegar dois ônibus todas as sextas e sábados do que vender no próprio bairro. Lá o seu produto não tinha o valor que merecia e aí passou a nos contar todos os detalhes da sua produção (Só na Bahia). Ali ela vendia por R$ 10,00 o copo do seu caldo delicioso e todas as noites vendia tudo que trazia. No seu Bairro pagavam somente R$2,50, no máximo R$ 3,00. A lei do mercado é certeira.
Chegou a hora de fecharmos a conta. Mais uma vez o garçom apareceu simpático e extremamente cordial. Aquela era a segunda ou terceira vez que o víamos naquela noite. Rapidamente ele retirou do bolso um bloquinho e foi fazendo a conta. Explicou que assim seria mais rápido, pois se fosse pedir a conta no caixa seria mais demorado devido a grande demanda do momento. Ok! (Como diz nossa filha).
Rapidamente rabiscou no papel. R$ 75,00 do petisco, R$ 10,00 da bebida e mais R$ 8,50 do serviço, a gorjeta opcional. Parecia tudo resolvido, bastaria um muito obrigado, até a próxima ou um volte outra vez. Não contava ele com os olhos afiados e a memória implacável da minha esposa.
- Moço existe um erro aqui! O petisco custa R$ 65,00 e não R$ 75,00. Por favor, nos traga o cardápio novamente.
- Claro, um momento. Aqui senhora. De fato houve um engano. Eu me confundi com o valor de outro item.
- Claro, um momento. Aqui senhora. De fato houve um engano. Eu me confundi com o valor de outro item.
Mas, a gentileza e o sorriso nunca sumiram daquela cara. Parecia tudo tão comum. Aquela atitude era um pouco do Brasil afundado!
(Artigo publicado em 20/10/2019 no Folhetim de Barrocas - FB. As ideias aqui expressas são de responsabilidade exclusiva do autor)