"APRENDIZES" DO NADA
"APRENDIZES" DO NADA
Toda Poesia é um corpo etéreo, imaterial, eflúvio espiritual de origem incerta, emanação do Espírito, desse NADA indefinido... quase sempre ! Sim, porque por vezes é apenas pensamento forçado tirado à fórceps do cérebro e não do coração. Em meses distintos deste ano achei nos "lixões" da Vida 2 livros semelhantes na forma e imensamente diferentes no conteúdo.
Apresentados com somente 2, 3, 5 ou 6 linhas, digo, versos, no pé de cada página, podemos distinguir com clareza o que é real Poesia do "poetar" inconsequente e, por vezes, de pouco sentido. No primeiro caso separei 3 páginas de obra "caseira" feita em xerox, capa dura sem título nem autor, data, local ou qualquer coisa que a identifique. No outro lado, alheio a rimas -- que critica, quase condena -- obra densa de significados. Tentei contactar Editora e autor sem sucesso, por isso reproduzo-a por minha conta e risco... divulgar Poesia NÃO PODE ser crime, com certeza ! (NATOAZEVEDO)
(pag.
(pag. 09):
São cavalo pálido no negrume
essas tuas metáforas de asas.
são simetria de argila e pedra
esses teus camelos de liberdade (sic)
são esteira de rimas telúricas
esses teus tons corrido nas veias (sic)
(pag. 19):
são rastro de machucar manhãs
esses teus abutres de mágoas
são chegada de velho amigo
essas tuas asas de vento
são cortiço de equívocos (sic)
essas tuas linhas de abismo
(pag. 32):
são açoute de boi no pasto (sic)
essas tuas assanhas de soluço
são oceano de piranhas
essas tuas façanhas de mudança
são saber imune de tramóias (sic)
esses teus cantos de galo
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RECICLAR traz dissabores mas, em compensação, tem algumas vantagens... se lamentamos que objetos que poderiam ser doados terminem destruídos (antes de serem descartados) é sempre um prazer encontrar livros seminovos, alguns até com dedicatória do autor.
Tive o desprazer de achar num "lixão" coletânea gaúcha da qual suei para fazer parte em 2003: deveria estar na Biblioteca oficial do município ! Agora, encontro curiosa obra em versos do carioca EMIL DE CASTRO (Livraria Edit. CÁTEDRA, 1992, TJ) dedicada a um teatrólogo local, que tive a honra de conhecer exatamente na época citada. Divirtam-se com o sarcasmo e a sutileza poética de um suposto "aprendiz", nos ensinando como dizer muito em poucas palavras. Eliminei alguns trechos com citações em francês e o nome de escritores e pintores que a "Geração Videogame" desconhece por completo. (NATOAZEVEDO - em 10/fev. 2019, ANANINDEUA, Pará)
APRENDIZ DO NADA
39
Não amarelo verde azul
quero meu país lilás.
01
Estranha sina das ruas:
nascem flores no seu leito
mas ninguém percebe.
05
A morte não avisa.
Pousa nos ombros.
Poe
07
Caminhei até o horizonte
onde me afoguei
no azul
09
A essência da arte
está no traço
sutil da lesma.
15
O importante não é a palavra
mas a sua espinha
submersa.
16
Eu não nasci ontem.
Mas antes do horizonte.
18
O que amo na minha cidade
é o rastro que ela deixou
no tempo.
20
O anzol náufrago nas águas
pescou-me a sombra
e a alma.
22
Antigamente se fazia amor
com os olhos cheio de flores
sem armadura.
23
Ver a mulher na vitrina
e amá-la com bocas e dentes
que o amor não tem olhos
mas fome.
25
Vai o semeador ao campo.
E volta triste.
Os pés cheios de raízes
daninhas.
26
A bola apunhala o verde
na hora precisa
em que o juiz apita
o fim do mundo.
27
Ando incendiado pelas ruas
carregando os verões desses janeiros
nesta sola de sapato roto.
31
Nos degraus de Ezra Pound
limpei meus sonhos
e vísceras.
37
No princípio
era a poesia sem rima
até que surgiu a praxis
de fazer rima
sem poesia.
43
No prato chegava a brilhar
o vazio redondo
achatado nos polos
com o fundo roído.
46
Os simples têm morte linda.
Apesar da roupa
desbotada.
50
Aqui jaz um homem triste.
Música maestro.
51
Rei morto; rei posto.
Poeta morto; poeta decomposto.
EMIL DE CASTRO / 1991