Plágio
Plágio!
Estive em Campinas esta semana. Pude vivenciar a ambiguidade das relações familiares e a dificuldade de definir relações afetivas tão paradoxais. Passei horas agradáveis com meus tios irmãos, meus primos sobrinhos, que vi crescerem, seus filhos, seus cachorrinhos de estimação... Presenciei os tios irmãos envelhecendo e eu também, ficando mais difícil definir a genealogia da relação que detenho com eles, uma confusão dos infernos: tios, irmãos, primos, sobrinhos, filhos.... o que são? Com certeza pessoas afetivas, espontaneamente queridas, que pisoteiam meu coração!
Em dado momento da intensidade de nossas relações afetivas, realçou um tema acadêmico, dentre outros, que aguçou a minha curiosidade, o plágio.
Chegando em casa, depois de matutar, resolvi: vou plagiar.
Não uma obra acadêmica, nenhum conto, romance, música, nem mesmo uma mísera crônica, meu filão preferido. Vou plagiar uma ação. Maligna. Um crime. Não de criminoso vulgar, político desavisado, não. Vou plagiar uma celebridade!
O motivo da escolha é simples, a presença da divindade, do sobrenatural interferindo de maneia soberana nos assuntos do cotidiano e a similaridade do que me levou e a celebridade a pensarmos em cometermos tal desatino.
A celebridade defendia a honra familiar, a reputação ilibada de sua prole.
Eu, as posses familiares.
Um e outro nos sentíamos ameaçados, apreensivos com o poderio destrutor de tais algozes, das suas capacidades infinitamente malignas, capazes de promoverem o extermínio, no caso da celebridade, moral, no meu, material, de coisas a nós dois, eu e a celebridade, queridas.
Fiz tal qual a celebridade, armei-me de uma carabina 38, dez tiros, e me encaminhei para o habitat do destrator. Chegando lá, fiquei na espreita, atento a qualquer movimento, silencioso, quase soturno. Era capaz de ouvir o arfar da respiração, sentir o palpitar do coração e os dedos destros deslizarem pela culatra, o gatilho, o cão do instrumento vingador.
Apareceu.
Ergui a carabina, alinhei a alça com a massa de mira bem no coração do vulgar exterminador, prendi a respiração e... senti um formigar, tal qual anestesiamento que me impediu de premir o gatilho fatal. Mudei a posição, refiz o rito de aniquilamento... e já. Novamente, o anestesiar do dedo indicador instantaneamente me remeteu para instâncias obscuras, e não pude recusar que uma força sobrenatural, acima de nós, estivesse a impedir que eu e a celebridade cometêssemos um pecado mortal, um crime de sangue.
Abaixei a carabina e observei a minha vítima, criminosa, ferozmente prepotente, afastar-se soberana, meiga, linda, pronta para abater mais um carneiro desavisado...