A PEQUENA HISTORIA DE UM GRANDE INVENTOR

Sol. Dia perfeito para um pedal pela ciclovia. Não satisfeito com a ergonomia, parei para ajustar o selim. Fiz aquela simples operação de desblocagem e blocagem tão rápida quanto automática sem me dar conta de que estava voltando no tempo! Em 1927, o italiano Tullio Campagnolo inventou a alavanca de blocagem de selim e rodas de bicicletas. O dispositivo quick release – troca rápida – viria a facilitar em muito a vida dos ciclistas que, além de sacar e repor as rodas rapidamente, teriam a possibilidade de ajustar a altura do selim sem que para isso precisassem de ferramentas. A ideia da blocagem teria sido criada por Tulio durante uma corrida no dia 11 de novembro daquele ano com a neve encobrindo as estradas das montanhas Dolomitas. Com as mãos inflexíveis devido a temperatura negativa, ele não conseguia soltar as porcas da roda traseira da bicicleta para fazer a mudança de relação ao inverter a roda. Naquela época, as bicicletas eram equipadas com duas catracas simples no cubo da roda traseira, uma de cada lado e de tamanhos diferentes. Isto obrigava os ciclistas a inverterem-na em determinados pontos do trajeto em relação a topografia. No quesito, mecânica ciclística, Campagnolo fora também chamado de Ferrari da bicicleta, de Da Vinci ou ainda, Daedalus, o criador na mitologia grega. Todo esse exagero é pouco para demonstrar sua capacidade. Ele nasceu em Vicenza, uma região pobre que havia sido devastada pela 1ª Grande Guerra. Tullio insurgiu naquele ambiente trabalhando com total abdicação para fazer o melhor. Naquele período, muitos desviadores de corrente artesanais com certa dose de precariedade já estavam sendo produzidos, a exemplo do Dux, que havia sido criado na Turim de 1934 em meio a era fascista. Porém, Campagnolo foi capaz de vencer a concorrência com a força de sua paixão pelo ciclismo e sua incrível capacidade de invenção ao impor simplicidade e funcionalidade ao seu modelo, e dessa forma gerou confiabilidade a todos os outros produtos. Campagnolo tinha um senso de observação altamente desenvolvido, e além dos desviadores de corrente, do cassette de engrenagens, câmbio e sistema de blocagem, inventou também o quebra-nozes e o saca-rolhas. Num jantar, ao perceber a dificuldade para abrir uma garrafa de vinho segurando-a entre os joelhos, para com a força de seu braço extrair a cortiça, Tullio repetiu para si as mesmas palavras que disse quando estava no Passo Croce d’Aune durante a corrida que o inspirou a inventar o saque rápido das rodas: - Algo deve ser melhorado aqui. Duas semanas depois, o saca-rolhas de duas alavancas com rosca helicoidal no centro nasceu para ser um ícone. Lembre-se dele quando for abrir o seu vinho! Digo sempre, que a dúvida gera evolução, porquanto a crença absoluta, estagnação. Não se pode jamais dar um fato por encerrado, um livro por concluído ou invento eternizado. O aprendizado continua, e tudo pode ser melhorado. Foi duvidando da eficácia do que via ou utilizava que Tullio os aprimorava. Se apenas acreditasse e aceitasse sem questionar, não haveria motivação para romper com o tradicional. Prova disso, é o que faz o CEO bilionário Elon Musk, dono da SpaceX, Tesla e outras startups de sucesso ao reinventar e desenvolver de forma brilhante o que já existe. E assim como o gênio Campagnolo que viveu entre 1901 e 1983, Elon usa a mesma filosofia: engenhosidade com simplicidade. Parafraseando Paolo Facchinetti, um dos autores do livro, A história que mudou a bicicleta, dedicado ao inventor: – Campagnolo é tão genial quanto os irmãos Wright. Já o jornalista Claudio Gregori que o chamou de Daedalus, concluiu poeticamente: - Os irmãos Wright transformaram a bicicleta em um avião, mas Campagnolo o fez voar. Exageros à parte, era evidente que Gregori estivesse desinformado quanto a sua equivocada parcialidade sobre a autoria do feito de voar por parte dos irmãos Wright, pois outros gênios da aviação também olharam muito para uma magrela com correntes, e certamente muito antes dos irmãos americanos se lançarem ao ar. O surgimento da Campagnolo como fabricante de componentes ciclísticos de excelência, foi devido em grande parte ao próprio Tullio, que além de trabalhar com liga leve de alumínio e magnésio para uso na construção do módulo espacial Apollo para a NASA, desenvolveu também rotores de helicópteros e um sistema único de freios usados na motovelocidade. No entanto, o grande negócio dele continuou sendo o ciclístico. Ele havia largado as competições e passou a segui-las para ouvir sugestões e modificar os produtos que atendiam as necessidades dos ciclistas. Na verdade, talvez ele já imaginava que não deveria apenas conseguir o cliente, mas principalmente, não o perder. Por isso, evidenciava pessoas em vez de clientes e ciclistas em vez de consumidores. Embora o protagonista seja um gênio autodidata, desses que não aparecem por aí a toda hora, essa história serve para que façamos evidentes questionamentos sobre a forma como tratamos nossos clientes, e principalmente sobre o nível do ensino em nossas escolas pelo Brasil afora. Infelizmente, não ensinamos a criar ou desvendar os mistérios por trás das invenções, quando menos, estimulamos a curiosidade para desenvolvê-las ou melhorá-las. E isto por si só, denota que algo vai mal na Educação Brasileira, levando-nos a crer que “algo deve ser melhorado”! E a resposta aí está! Parabéns a Jaraguá do Sul e aos seus professores pelo 2º Movimento Jaraguá em Ciência! Este é o caminho. Não existe atalho para o sucesso! Tim-Tim! Um brinde à Campagnolo e aos gênios que moldam nosso futuro!