Seu Luís e Dona Da Luz
Todos os dias quando eu ia trabalhar, pela manhã cedinho, lá estava Dona Da Luz varrendo a calçada com sua vassoura de piaçá. Quando eu voltava, à noite, lá estava seu Luís sentado na cadeira de balanço olhando às vezes para os meninos brincando na rua ou contemplando o céu estrelado. Ah! Como era bom cumprimentar Dona Da Luz todas as manhãs e quando ouvia as suas palavras angelicais: “bom dia, minha fia.” Ou então quando cumprimentava seu Luis e ele me dizia: “boa noite, moça trabalhadeira.” Quantas saudades daquele casal que viveu tantos anos juntos, moravam na rua que dá acesso à minha casa...a rua onde os meninos gostam de brincar de carro de mão e descer ladeira abaixo como um carro de corridas em alta velocidade.
Faz algum tempo, Seu Luís partiu. Os filhos casaram. Dona Da Luz ficou sozinha na sua casinha, mas mesmo assim ela demonstrava uma felicidade sem igual. Essa felicidade que a gente já não encontra mais nas pessoas. Agora eu só tinha o “bom dia, minha fia” de Dona Da Luz. Mas o cantinho da cadeira de balanço de Seu Luís continuava lá, porém vazio. Ele adorava ficar embaixo de uma árvore cheia de galhos que tinha bem em frente a casa deles. Eu, particularmente, achava aquela árvore tão bonita. Mas eu acho que Dona Da Luz depois de algum tempo começou a se sentir um pouco sozinha, e aí ela trouxe um netinho para morar com ela. Passado algum tempo, eu não sei porque, mas Dona Da Luz também mudou-se para um outro bairro, uma outra casa, novos vizinhos, e com ela se foi a árvore que eu achava tão bela. A linda árvore foi cortada com um facão bem afiado galho por galho, até chegar no seu lindo tronco, este homem, esta perfeição e semelhança de Deus, corrompida pela hipocrisia da vida, esse estúpido homem, meteu um machado afiado no tronco daquela linda árvore.
Que vazio ficou ali, gente! Pela manhã o que me faz mais falta não sei se é o bom dia carinhoso de Dona Da Luz ou se o barulho da sua vassoura piaçá demonstrando toda a sua coragem para enfrentar um novo dia. À noite, quando passo, não sei se sinto falta de Seu Luís ou do seu balançar na sua cadeira de balanço demonstrando a paciência que o homem deve ter para com a vida e com as crianças. Quanto a árvore acho que sinto saudades da sombra que ela fazia na calçada de Seu Luis e Dona Da Luz que nenhum menino era tonto de ir fazer barulho lá, pois eles adoravam silêncio, e ai de quem fosse fazer barulho na janela de Seu Luis. Sob aquela sombra enorme relembro a última vez que vi Dona Da Luz sentada na calçada com a sua larga saia, blusa de mangas longas, com as pernas estiradas, descalça, cabelos presos, mas um pouco desalinhados na fronte, a vassoura de piaçá ao seu lado e a porção do lixo que já tinha varrido e juntado no cantinho da parede...lixo que se resumia em folhas secas.
Vocês partiram Seu Luís e Dona Da Luz, mas aquela casa, aquela calçada, e a lembrança de vocês nunca vai partir da minha saudade. Ah! Pelo menos o novo morador ainda não mudou a cor da casa, continua a cor rosa, como uma rosa é Dona Da Luz.