Um Carioca em São Paulo
Em 1988 eu era Gerente Nacional de Vendas de uma Multinacional. Esta função me obrigava a estar toda segunda feira na fábrica para uma reunião rotineira e depois, aí sim, viajar por todo o País. Foi numa dessas viagens que passei por uma experiência jamais imaginada:
Naquele domingo peguei a ponte aérea para São Paulo um pouco mais cedo do que o de costume, quando lá cheguei instalei-me no hotel Hilton e sai para jantar.
Não é segredo para ninguém que aquela cidade não para nunca, por isso após o jantar aproveitei para engraxar meus sapatos. Gostava de fazê-lo numa loja de engraxates próxima ao hotel, cujas cadeiras eram bem altas e eu, sentado ali em cima, podia observar tranquilamente as pessoas, com bastante clareza, que passavam pela calçada. Umas absortas em seus pensamentos, ou consultando as revistas da banca de jornal que existia bem em frente, outras conversando com seu acompanhante e algumas até falando sozinhas mesmas.
A vista pela porta, parecia ser uma grande tela cinematográfica e neste dia tive a oportunidade de presenciar um punguista em ação. Tudo foi muito rápido. Uma daquelas pessoas que passava distraída nem se deu conta de quando o meliante enfiou a mão no bolso de sua calça e saiu em disparada pela avenida. A desolação estava estampada em seu rosto, nesse tempo ainda se andava com todo o dinheiro no bolso e pela sua fisionomia devia ter perdido uma boa quantia. Fiquei indignado, mas não pude fazer nada, pois o safado desapareceu no meio das pessoas que por ali passavam.
Voltei ao hotel. Tomei um banho para relaxar e dormir, mas aquela cena não saía da minha mente. Na manhã seguinte fui para fábrica ainda com a visão na cabeça e dizia para mim mesmo; comigo isso não acontece. Durante o expediente da manhã não pude deixar de comentar sobre o presenciado e aproveitar para mexer com os colegas, registrando que as pessoas em São Paulo não estão atentas por onde andam, por isso sofrem esse tipo de agressão. Não gostaram muito do meu comentário, afinal, como todo carioca é gozador, eles sentiram uma ponta de gozação da minha parte.
Mais tarde saímos para almoçar fora. Ao descermos do táxi e caminhar até o restaurante, para minha surpresa, nesse curto espaço, fui também vítima de um punguista. Todos riram satisfeitos e eu, como não podia deixar de ser, fiquei qual uma arara de tanta raiva.
Quem diria, um carioca acostumado à malandragem do Rio de Janeiro, em São Paulo iria ser vítima de um punguista em plena Avenida Paulista.
É realmente uma verdade o que diz a música, “malandro é malandro e mané é mané”. E eu, como muitos outros, tive também o meu dia de mané, mas pior que ser roubado foi ter que aguentar a gozação dos paulistas durante resto do dia.
Mas, roubo a parte, fica a saudade de uma época onde só éramos pungados, hoje sofremos com sequestros relâmpagos, que muitas das vezes resultam em morte.
19/07/02