Um Carioca em Teresina

Era a primeira vez que eu ia ao Piauí naquele ano (1986). Cheguei de Belém numa quarta feira a noite e hospedei-me no hotel Luxor, bem no centro de Teresina, a capital do Estado. Iria trabalhar na cidade durante dois dias e depois viajaria para Natal.
Não posso precisar o mês que fiz essa viagem, foi há mais de vinte anos, mas lembro como se fosse hoje. O hotel ficava em frente a uma bela praça e várias coisas chamaram-me a atenção quando lá estive.
O povo que lá encontrei era bem acolhedor, mas me pareceu sofredor. Também fiquei impressionado com o número de pessoas que haviam sofrido um AVC. O calor era insuportável, e olha que estou acostumado a ele. Outra coisa interessante que constatei foi quando visitei um espaço público as margens do Rio Parnaíba, local este, onde as pessoas lá, compravam e trocavam de tudo, desde que usado. Um pouco mais adiante, ainda na margem do rio, haviam vários estabelecimentos rústicos, feitos em madeiras e cobertos com palha, onde se podia sentar, tomar uma cerveja e beliscar um tira gosto, mas estavam vazios, talvez à noite fossem mais frequentados. Ali tomei minha cerveja e apreciei a paisagem acolhedora do local. Outra coisa que me surpreendeu foi a feira existente em uma das ruas laterais a esta praça, próxima do hotel, onde era vendido, livremente, vários tipos de aves (passarinhos), sem que seus vendedores fossem incomodados pelas autoridades.
Impossibilitado de fazer a viagem para Natal, por falta de vaga no voo, naquele final de semana fiquei na cidade. Não tendo nada para fazer, resolvi assistir a uma partida de futebol para passar o tempo. O jogo foi entre o Piauí Esporte Clube e um time do interior que agora não me recordo o nome, mas acredito que o clássico não era muito importante pois o Estádio estava bem vazio. Acomodei-me no lado da torcida visitante e contei, não mais que dez pessoas, isso mesmo dez pessoas. Do outro lado, bem a minha frente, estava a torcida do Piauí que também não passava de mil expectadores, talvez. Esse quadro assustador me fez lembrar o quanto era pobre aquele Estado, entretanto, momentos antes fui testemunha de um fato inusitado, para não dizer dantesco, revoltante, triste.
Estava na porta do hotel quando chegou de táxi um senhor elegantemente vestido, usava terno e gravata em pleno domingo de manhã. Imediatamente o porteiro, subserviente, saiu em sua direção pegando suas malas e trazendo, para a recepção do hotel. Da porta pude ouvir e ver a arrogância daquele senhor ao perguntar se já havia chegado seu empenho. Estranhei na hora, pois sabia o que ele queria.
A curiosidade me levou a perguntar ao porteiro de quem se tratava, e pasmem, fiquei sabendo que aquele respeitável senhor era um Deputado Estadual que morava na Parnaíba, cidade litorânea, e estava chegando a capital, que fica no interior do estado, para trabalhar. Sua estadia, num hotel de quatro estrelas, durante toda a semana seria paga com dinheiro público, quando o certo seria ele alugar uma casa na cidade, com seu próprio dinheiro, e ali viver enquanto durasse o exercício do seu mandato.
Infelizmente essa e outras aberrações fazem parte da nossa realidade, e cada vez mais, o povo fica a mercê desses vampiros, que infestam o País.
Até quando teremos que aturar isso?

26/07/00
Fernando Antonio Pereira
Enviado por Fernando Antonio Pereira em 08/10/2019
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