Futebol no bar do Mário
Quando lembro de minha infância, e quando relaciono essa lembrança ao futebol, a primeira imagem que emerge, das profundezas de meus pensamentos, é um jogo que assisti no Bar do Mário Casagrande, próximo da rodoviária, em Redentora.O Bar do Mário, que já não existe mais, ficava localizado, onde hoje, pelo que sei, existem casa de moradias, cheguei a morar no local muitos anos depois. Lembro-me com perfeição da época em que ali ainda era bar, ou pelo menos, com a perfeição que minha mente, então infantil, me permite lembrar.Tinha uma espécie de área aberta na frente. Com apenas as bases de madeira horizontal que a circundavam. Uma porta grande, creio que de madeira, e um janelão, sempre aberta. Na parte interna um balcão tipico de bolicho de um tempo que já se foi, onde as suas pequenas vitrinas, de vidro, permitia à criançada ver as guloseimas apetitosas que ficavam do outro lado.Sobre o balcão havia um baleiro giratório e um vidro com ovo de galinha em conserva, além de uma estufa onde ficavam alguns pastéis e galetos fritos, passados na farinha de trigo. Eram petiscos para acompanhar a cerveja.Atrás do balcão tinha uma prateleira com diversas garrafas, as geladeiras, os congeladores e o Mário, que estava sempre discutindo com algum cliente por causa de futebol.Quase no canto que dava para uma porta que levava para dentro da casa onde Mário morava com a família, no alto, ficava uma televisão, 14 polegadas, de cubo gigante, que na maioria das vezes estava sintonizada na Globo. Naquela época, em Redentora, era possível sintonizar três canais de televisão somente com uma antena espinha de peixe: Globo, SBT e Band. Em alguns pontos, pegava, inclusive a já extinta TV Manchete.O ano de 1996 era um ano mágico para o Grêmio. A equipe que era treinada pelo técnico Luiz Felipe Scolari, entrava no seu segundo ano de pujança em termos de futebol. A dupla Paulo Nunes e Jardel era uma unanimidade no futebol brasileiro e aquele time jogava um jogo digno de um campeão.Minha lembrança de futebol no Bar do Mário veio de um jogo no Campeonato Brasileiro de 1995. Grêmio e Botafogo, numa tarde de domingo.Na minha vila não havia nenhuma televisão, era apenas o velho e bom rádio, onde ouvíamos todos os jogos, acompanhávamos as notícias e até ouvi amos as novelas da globo que podiam ser sintonizadas no aparelho de ondas curtas, mas naquele dia, aproveitamos o descuido das mães e com as chinelas havaianas nas mãos saímos no meio da tarde para jogar bola num campinho próximo e fugimos para o Bar do Mário para ver o jogo do Grêmio.O local estava cheio de homens. Todos na parte interna do ambiente bebendo cerveja, falando alto e olhando para a televisão que transmitia em preto e branco. Nós não entramos, mas nos empoleiramos no janelão e ficamos nos acotovelando para encontrar espaço para ver o jogo. Como eu era o menor, pouco consegui ver do jogo, mas sempre que olhava só via o Grêmio com a bola. Antes que pudesse me atinar era arrancado do meu espaço e colocado no chão de novo, e ficava tentando, do fundo, ver por entre as cabeças o que estava acontecendo. Quando saiu um gol eu comemorei desesperadamente. Era gol do Grêmio. Todo mundo me olhou com o rabo do olho e alguns começaram a me chamar de colorado. Demorei tempo demais para entender que na TV, preto e branco, as camisas de Grêmio e Botafogo eram semelhantes e somente no final do jogo me dei conta que o Grêmio havia perdido por 1 a 0.Depois do jogo voltamos para casa. Alguns apanharam, outros ficaram de castigo, e eu recebi alguns conselhos de minha mãe Catarina, que nunca me batia, e ganhei um rádio novo, quando contei que tinha odiado ver o jogo na televisão. Primeiro por não identificar quem era quem, e o mais importante, na televisão o meu Grêmio perdia e no meu rádio era imbatível. Tomei preferência pelo rádio e o Grêmio foi campeão Brasileiro daquele ano.