O PALHAÇO CORRUPTOR
Estava voltando da atividade com 32 adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
O objetivo é estimular o gosto pela escrita, desenvolvendo um treinamento para que venham a se tornar escritores biógrafos e editores de livros.
Compartilhar com eles o meu trabalho de 38 anos é emocionante, vivenciando a primeira experiência voluntária e que estou adorando.
É desafiador, especialmente por abrir possibilidades profissionais que poderão ser divisores de águas em suas vidas.
Saí do encontro literalmente mexido, pois tive noção de que será dura empreitada, já que os textos que produziram iam bem além das tantas imperfeições gramaticais.
Os relatos deles respingavam bem a crueza do seu mundo, esbanjando imperfeições e chicotadas que merecem dar lugar a novo cenário.
Assim poderão ter triste passado com futuro feliz.
Quando aguardava o ônibus numa movimentava avenida de Campinas, vi um palhaço se aproximando.
Deveria ter por volta de 55 anos e tinha a cara pintada, vestindo camiseta colorida, bermuda bege e meia 3/4.
Começou a puxar papo comigo.
Desandou de meter pau no governo, na roubalheira desenfreada e na sórdida atuação da nossa política.
Ficou assim uns 20 minutos, falando sem parar.
Chegou o ônibus dele.
Acenou para o motorista com algo nas mãos, que abriu a porta da frente para ele entrar.
Deu ao motorista o que parecia ser uma bala de goma e este abriu a porta de trás.
O palhaço desceu à rua e entrou pela porta traseira, quando começou a fazer seu trabalho: vender bala de goma aos passageiros, chamando atenção pela forma como estava caracterizado que, imagino, era algo premeditado.
O ônibus seguiu seu caminho.
Aquele palhaço, tão inconformado com as falcatruas e armações dos nossos governantes, não tinha o menor pudor em corromper o motorista com bala de goma para entrar no ônibus sem pagar a passagem.
Assim fazia a sua parte para manter viva a chama dessa corrupção que tanto abominava.