O senhor é o cantor?
O senhor é o cantor?
Ouvi contar de um pequeno café na Bélgica onde vigora o costume de deixar pago com antecedência um café, sanduíche e até mesmo uma refeição completa para quem não pode pagar. Parece que isso começou em Nápoles.
"Os unicórnios com árvores se pegam, com espelhos os ursos, os leões com fortes redes, os elefantes com profundas covas e os homens com lisonjas”. Frase do brother Shakespeare, que poderia ter acrescentado, com um pouco de humanidade.
Nunca bebi diretamente na fonte dos gregos, observo apenas que na Grécia Antiga podia-se ficar mais rico possuindo muitos escravos. Havia uma farta população de escravos. Toda aquela audaciosa conversa ateniense sobre democracia aplicava-se somente a uma minoria. Platão e Aristóteles sentiam-se à vontade numa sociedade escravocrata. Eles deram justificativas para a opressão, serviram a tiranos, ensinaram a alienação do corpo pela mente, uma idéia natural numa sociedade escravocrata.
Colega, sob a Luz da Nova Era tem muita coisa esfacelando. Educação*, por exemplo, um tema espancado diuturnamente, cujo conceito em si implicava num mínimo de molejo na dita Norma Culta, num bom passeio pela literatura, pois sem grandes histórias ficamos prisioneiros da nossa estreiteza mental, e adicione-se a esses certa eficiência no manejo do 2+2=4, uma pitada de história geral, outra de geografia, mas qual, o educador atual carrega além da boina, um cantil e as gotas que saem dele, regulares como bananas em caçamba de caminhão, se resumem a orientação sexual, prestância de alucinógenos, devoção para o linguajar dos guetos, construção do patrão inimigo e do capitalismo maldito, por aí a fora.
No dia a dia, vê-se os frutos dessa aleivosia em maior ou menor grau.
Mês passado uma grande amiga fez aniversário e me pediu o cantor. Certa doença degenerativa levou-a a chamar de lar uma casa com 150 outros residentes, ambiente muito alegre e limpo, diga-se de passagem, e a festa foi no pavilhão central, 10 quilos de bolo, 5 fornadas de salgadinhos, refrigerantes, cuidadores, enfermeiras, duas da tarde de uma quarta feira com temperatura módica.
Não sei de qual cartola ela tirou esse profissional de entretenimento, sei que chega uma trupe na porta do salão carregando a parafernália costumeira e eu, avisado pela quinta vez que deveria pagar em dinheiro assim que ele chegasse, me dirijo ao grupo sem na verdade saber o rosto ou o nome do cacique.
A gente faz uma leitura rápida, às vezes funciona.
- O senhor é o cantor?
Cabeludo, quarentão passado, arrisco 50, vestimenta beirando o circense, ao invés de um sorriso e uma resposta objetiva, me veio com um sermão descabido sobre a desvalorização do artista pela sociedade, e quem era eu para interpelá-lo de tal forma?
- Sou a pessoa que vai pagar o seu cachê - respondi com simplicidade, porque esta era minha missão no momento. Nada mais.
Ele me mediu e, como um prestidigitador de palanque, saiu do semblante sofrido para a candura convertida, explicando inclusive que a causa da sua animosidade, again, era a desvalorização do artista pela sociedade.
Paguei e dei de ombros, não sem antes externar que talvez não estivesse assim tão mal cotado, já que a minha amiga fez questão da presença dele e, para arrematar, essa saiu deslizando com delicado prazer:
- Olha, se eu fosse o cantor, teria muito orgulho disso.
Aí o cara congelou, como que fisgado por um zangão. Conversa encerrada.
Cantou direitinho, em italiano, para deleite da aniversariante.
Ora, resta um detalhe crucial na atmosfera dos padecedores pátrios que deve ser considerado na hora de defini-los - O Brasil é um país de algozes. No último domingo minha mãe foi para o hospital numa ambulância do Samu. Durante a corrida ficamos sabendo que o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência possui apenas duas ambulâncias para a Zona Sul de São Paulo. Uma piada trágica. Não obstante, os inclementes que ostentam bastões do poder público compram jatinhos por bagatelas com dinheiro alheio. Mesmo sem ser psicólogo, acho que isso ronda mentes e corações feito pulgas num chiqueiro.
Enfim, do estabelecimento na Bélgica, cujo pedido é feito assim: Cinco cafés, por favor. Dois deles para nós e três suspensos (que se destinam para os vindouros), aos escravos contemporâneos de Platão e a nossa cultura nublada e vitimista, resta uma única frase costurando tudo - O homem vale o que é diante de Deus, e nada mais. (Kuthumi)
Combinei com a amiga que ano que vem vamos convidar Frank Sinatra e Michael Jackson.
*(Educação no Brasil - Globo, Itaú, Vivo, Estácio, etc. promovem neste setembro o seminário Encontro Internacional sobre “os desafios e o futuro da Educação”. A palestra de encerramento é do youtuber Felipe Neto, o guru que ensina o seu público - predominantemente infanto-juvenil - técnicas de sexo oral.)
O senhor é o cantor?
Ouvi contar de um pequeno café na Bélgica onde vigora o costume de deixar pago com antecedência um café, sanduíche e até mesmo uma refeição completa para quem não pode pagar. Parece que isso começou em Nápoles.
"Os unicórnios com árvores se pegam, com espelhos os ursos, os leões com fortes redes, os elefantes com profundas covas e os homens com lisonjas”. Frase do brother Shakespeare, que poderia ter acrescentado, com um pouco de humanidade.
Nunca bebi diretamente na fonte dos gregos, observo apenas que na Grécia Antiga podia-se ficar mais rico possuindo muitos escravos. Havia uma farta população de escravos. Toda aquela audaciosa conversa ateniense sobre democracia aplicava-se somente a uma minoria. Platão e Aristóteles sentiam-se à vontade numa sociedade escravocrata. Eles deram justificativas para a opressão, serviram a tiranos, ensinaram a alienação do corpo pela mente, uma idéia natural numa sociedade escravocrata.
Colega, sob a Luz da Nova Era tem muita coisa esfacelando. Educação*, por exemplo, um tema espancado diuturnamente, cujo conceito em si implicava num mínimo de molejo na dita Norma Culta, num bom passeio pela literatura, pois sem grandes histórias ficamos prisioneiros da nossa estreiteza mental, e adicione-se a esses certa eficiência no manejo do 2+2=4, uma pitada de história geral, outra de geografia, mas qual, o educador atual carrega além da boina, um cantil e as gotas que saem dele, regulares como bananas em caçamba de caminhão, se resumem a orientação sexual, prestância de alucinógenos, devoção para o linguajar dos guetos, construção do patrão inimigo e do capitalismo maldito, por aí a fora.
No dia a dia, vê-se os frutos dessa aleivosia em maior ou menor grau.
Mês passado uma grande amiga fez aniversário e me pediu o cantor. Certa doença degenerativa levou-a a chamar de lar uma casa com 150 outros residentes, ambiente muito alegre e limpo, diga-se de passagem, e a festa foi no pavilhão central, 10 quilos de bolo, 5 fornadas de salgadinhos, refrigerantes, cuidadores, enfermeiras, duas da tarde de uma quarta feira com temperatura módica.
Não sei de qual cartola ela tirou esse profissional de entretenimento, sei que chega uma trupe na porta do salão carregando a parafernália costumeira e eu, avisado pela quinta vez que deveria pagar em dinheiro assim que ele chegasse, me dirijo ao grupo sem na verdade saber o rosto ou o nome do cacique.
A gente faz uma leitura rápida, às vezes funciona.
- O senhor é o cantor?
Cabeludo, quarentão passado, arrisco 50, vestimenta beirando o circense, ao invés de um sorriso e uma resposta objetiva, me veio com um sermão descabido sobre a desvalorização do artista pela sociedade, e quem era eu para interpelá-lo de tal forma?
- Sou a pessoa que vai pagar o seu cachê - respondi com simplicidade, porque esta era minha missão no momento. Nada mais.
Ele me mediu e, como um prestidigitador de palanque, saiu do semblante sofrido para a candura convertida, explicando inclusive que a causa da sua animosidade, again, era a desvalorização do artista pela sociedade.
Paguei e dei de ombros, não sem antes externar que talvez não estivesse assim tão mal cotado, já que a minha amiga fez questão da presença dele e, para arrematar, essa saiu deslizando com delicado prazer:
- Olha, se eu fosse o cantor, teria muito orgulho disso.
Aí o cara congelou, como que fisgado por um zangão. Conversa encerrada.
Cantou direitinho, em italiano, para deleite da aniversariante.
Ora, resta um detalhe crucial na atmosfera dos padecedores pátrios que deve ser considerado na hora de defini-los - O Brasil é um país de algozes. No último domingo minha mãe foi para o hospital numa ambulância do Samu. Durante a corrida ficamos sabendo que o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência possui apenas duas ambulâncias para a Zona Sul de São Paulo. Uma piada trágica. Não obstante, os inclementes que ostentam bastões do poder público compram jatinhos por bagatelas com dinheiro alheio. Mesmo sem ser psicólogo, acho que isso ronda mentes e corações feito pulgas num chiqueiro.
Enfim, do estabelecimento na Bélgica, cujo pedido é feito assim: Cinco cafés, por favor. Dois deles para nós e três suspensos (que se destinam para os vindouros), aos escravos contemporâneos de Platão e a nossa cultura nublada e vitimista, resta uma única frase costurando tudo - O homem vale o que é diante de Deus, e nada mais. (Kuthumi)
Combinei com a amiga que ano que vem vamos convidar Frank Sinatra e Michael Jackson.
*(Educação no Brasil - Globo, Itaú, Vivo, Estácio, etc. promovem neste setembro o seminário Encontro Internacional sobre “os desafios e o futuro da Educação”. A palestra de encerramento é do youtuber Felipe Neto, o guru que ensina o seu público - predominantemente infanto-juvenil - técnicas de sexo oral.)