A REUNIÃO
Segunda feira tensa no C.P.D. Daqui alguns minutos todos participarão da “a reunião” que poderá mudar o rumo de tudo o que você conheceu até hoje deste departamento. A apresentação estava pronta e os apresentadores ansiosos ensaiavam as frases de efeito para impressionar o presidente e conseguir aprovação esperada há tempos.
Os colaboradores não continham o nervosismo e estavam ansiosos pela participação pela primeira vez em todos esses anos de empresa do presidente, Dr. Aristóteles, alguns colaboradores com mais de dois anos não conheciam ele pessoalmente. O nervosismo natural era reforçado pelos insistentes lembretes da chefe do departamento, a gaúcha Ieda:
- O Dr. Aristóteles vai tá reunião, pessoal! Agilizem as apresentações!
- Não esqueçam das frases de efeito, Dr. Aristóteles tem que aprovar o projeto!
- Dr. Aristóteles é exigente, vocês já conhecem a fama dele, se ele não gostar da apresentação ele manda parar! Então foco na apresentação! Treinem pessoal, treinem muito, o aquário tá a disposição para vocês treinarem, e se quiserem minha avaliação da apresentação é só chamar!
Antes do horário agendado, todo o departamento já se encontrava na sala do conselho, 20 pessoas. Microfone testado uma, duas, três vezes. Slides no ponto. Ieda conseguiu que os slides também fossem impressos e conseguiu um milagre ainda: impresso colorido. Os impressos na ordem de apresentação colocados na pasta da empresa e milimetricamente dispostos nos lugares onde estariam Dr. Aristóteles e os demais diretores. Silêncio mortal na sala.
Dr. Aristóteles era pontual e gostava de pontualidade. Dez horas, horário de início da reunião. Nada do Dr. Aristóteles. Ieda olhava do relógio para a porta, da porta pro relógio. Dez horas e um minuto, Ieda impaciente. Dez horas e cinco minutos, o silêncio continua na sala. Dez horas e dez minutos todos impacientes, alguns copos de água já estavam vazios. Algumas cadeiras giravam de um lado para o outro fazendo perceber que precisam de um óleo. Blocos de anotações começavam a ser preenchidos por desenhos abstratos e surrealistas. Alguns cochichos começavam a se ouvir.
O telefone da sala do conselho tocou. Todos se olharam. Ieda atendeu com seu peculiar tom seco dizendo:
- Ieda!
Depois disse mais três palavras secas:
- Sim!
- Tá!
- Aviso!
Ieda desligou o telefone e falou:
- era Dona Elisabeth avisando que Dr. Aristóteles está no trânsito mas já está chegando e é para esperarmos aqui na sala!
Silêncio de alguns. Resmungos de outros. Não tinham o que fazer além de esperar. Alguém comentou com o colega ao lado:
- o professor deu uma prova de cinco questões de “verdadeiro” ou “fácil”!
- hã... peraí, tenho que reprocessar de novo!
- então, era uma prova inicial de iniciação!
Outro colega se meteu na conversa:
- o professor indagou o motivo de o aluno, burro, ter feito um triângulo ao invés de um quadrado!
- não insira elementos geográficos na história! Disse outro.
Assim aos poucos o pessoal foi se soltando, enquanto aguardavam a chegada do Dr. Aristóteles, diminuindo o nervosismo da apresentação. A conversa tomou conta da sala de reunião. Assuntos variados ressoavam na sala: trabalho, jogos, futebol, escola, comida, bebida. As conversas se misturavam e até se confundiam entre as vinte pessoas presentes:
- quanto está o litro de “velho barreto”?
- isso é sazional, primeiro passo inicial é a busca da procura!
- melhor! vamos buscar na busca! Isso é uma luz no fim do túmulo!
- isto é de “plaxe”, eu sempre tenho uma bala na manga!
- com base nisso a gente tem uma base que todas as possibilidades que possibilitem que a informação informou...
- você “comeriria”?
- existia uma ausência de informação, de quais situações estão em qual situação? Entendeu? Esta é uma melhoria para melhorar!
- tenho certeza que eu acho! Que todo mundo é igual pra todo mundo. Pois, foi no começo que a gente começou a colocar as pernas nos “is”!
- fiquei puto e falei pra ele: vá plantar macaco! Não sabe arquivar no arquivo...
- eu sempre fui da idade que eu sou e minha mãe não me deixava ir na “lanhouse” porque eu era menina... péra! Eu ainda sou menina!
- dai, fizemos a alterança, refazer novamente, porque eu tinha lançado esse lançamento e foi aí que fiquei absurdado ao identificar o que foi identificado...
- você viu aquele filme “o auto da comparecida”?
- no “geratório” era cada flegada mano, depois a chefe mandou desflegar tudo, puta que pariu, o pior de tudo é que depois mandou flegar, vai entender!
- já no começo eu comecei, eu incluo eu, porque estamos em época de vacas de dieta...
- aonde que não está aparecendo? antes ou default? Ela alterou a data do evento e não “desalterou”!
- quanto mais a gente envelhece, mais aparece pelo em lugar errado.
Passados trinta minutos, todos estavam distraídos, sorridentes e alegres, menos Ieda, que estava angustiada e irritada pelo barulho da conversa dos subordinados, foi quando o telefone tocou. Ieda gritou pra sala:
- verdo!
Pessoal se olhou e silenciou. Enquanto Ieda falava ao telefone alguém cochichou para um colega do lado:
- você que conhece o dicionário da chefe, o que significa “verdo”?
- Ixi, cara! Ela criou outra palavra, vamos ter que adicionar mais esta...
Ieda desligou e disse frustrada:
- Era Dona Elisabeth, Dr Aristóteles tá preso no trânsito e a reunião está cancelada. Todo mundo para o trabalho agora!
A mudança do nome do departamento de C.P.D. para departamento de T.I. ficou para uma outra oportunidade e vai depender da agenda do Dr. Aristóteles.