Monolito Vivo
Descobri, pela manhã, analisando o clima lá fora, que os anos continuam praticamente os mesmos. Fazia sol e uma discreta brisa matinal se manifestava livremente. Lembrei-me do Ano Um -- o Primeiro Passo para o tempo de hoje. Agora sou um quarentão em busca de realizar sonhos de vinte, vinte e cinco anos atrás. Tocar guitarra (já que bateria não consigo aprender, uma vez que sou afobado demais para fazer coisas diversas, ao mesmo tempo, com as mãos e com os pés) numa banda de metal. Lançar CD dessa banda. Produzir meus próprios CD, por ter condições disso.
Mas o negócio é outro. Não é sobre música que eu vim falar aqui. E sim sobre a atemporalidade. Fenômeno talvez pouco estudado pelo ser humano. Ontem eu percebi que, com a idade, há uma gradativa perda da sensibilidade (para se importar com os problemas, para se importar com a Vida), que afeta, de um modo geral, inclusive os nossos desejos e gostos. A gente parece que perde muitos deles. Ao realizar sonhos de vinte ou mais anos atrás, sente-se envolto num vazio, num deserto, em que monologa num ambiente sem eco, sem vida, sem nada. Como se não passássemos de uma mente sem um cérebro. Como se fosse um monolito vivo e com capacidade de pensar.
A minha capacidade criativa, FELIZmente, ainda não me abandonou. Todos os dias tenho contato com assuntos os quais me interessam na fase de minha vida em que eu porventura me encontro. Atribuo a essa perda da sensibilidade como a causa da sensação monolítica, totalmente solitária. (Lembra-me até o título de um som do Darkthrone: "Earth's Last Picture" ["A Última Imagem da Terra", em tradução livre]).
"2001" foi o assunto de 1968. Aquele monolito preto, objeto de discussões acadêmicas... O Black Sabbath nem existia -- ainda. Mas o Blue Cheer (EUA) ensaiava um proto Heavy Metal na terrinha do Tio Sam, com seu "Vincebus Eruptum". A capa dessa preciosidade sonora/artística parece esboçar uma espécie de parâmetro artístico a ser retomado, coisa de trinta anos mais tarde, por bandas de Doom e de Stoner Metal. (Sou de 1977. Não consigo conceber o HM em plena década de 70. Isso soa como uma viagem no tempo, sabe?)