O TEMPO MUDA TUDO

A marcha silenciosa e constante do tempo faz tudo mudar.

Mesmo que saibamos que os acontecimentos são cíclicos e que vez por outra erros e acertos são repetidos por nós ou por outras pessoas, apesar das pequenas variações, o cerne das ações não se modifica por mais diferentes que estejam as circunstâncias.

Já não se vêm pessoas conversando nas calçadas sob a luz baça dos raros postes de iluminação pública, nem mais existem aquelas donas Marias, velhas senhoras, empregadas das casas por muitas gerações e que foram as testemunhas mudas dos grandes e dos pequenos acontecimentos familiares, mas que perderam espaço para o universo da internet, do telefone celular e dos minúsculos apartamentos das famílias cada vez menores, cada vez mais ausentes.

Elas sim sabiam contar com detalhes as histórias “horripilantes” dos fantasmas do tuberculoso e da mulher de branco que perseguiam os incautos e os raros notívagos nas ruas desertas ou dos capirotos que provocavam os sonhos maus naquelas crianças que se esqueciam, ou que por birra, deixavam de rezar o “santo anjo do senhor” antes de dormir.

Aqueles fantasmas do dia a dia dos habitantes das cidades antigas como o Recife foram eliminados pela luz elétrica e pelas mudanças dos hábitos familiares.

Aquelas sombras fortuitas que se insinuavam através das vidraças enfumaçadas, das cortinas pesadas, dos corredores escuros e malcheirosos deixaram de fazer parte das raras conversas das famílias, porque perderam espaço para os comentários sobre personagens das novelas ou para os escândalos protagonizados por nossos indignos representantes ou governantes.

O progresso derrubou os casarões, as ruas foram alargadas e asfaltadas porque a população cresceu e hoje vive empoleirada em apartamentos cada vez menores em prédios cada vez mais altos que ocupam os terrenos antes baldios com mato rasteiro, moitas de jurubebas e carrapateiras aonde se escondiam as cabras cabriolas, os sacis, as mulas sem cabeça, o homem do saco e os lobisomens das noites de lua cheia.

Hoje com o zati-zapi a pessoa coleciona milhares de “amigos”, mas não sabe o nome do vizinho de porta nem a cor dos olhos do porteiro do prédio onde mora.

Festa em casa de alguém da família, nem pensar.

Se num clube ou área de convivência de um fast-food qualquer, talvez vá, mas dá arrepios só de imaginar aquelas crianças filhas dos parentes, tão mal-educadas e barulhentas; aquelas velhas fofoqueiras; aquele primo, um beberrão metido a sabe tudo...

O tempo mudou os nossos hábitos, mas a nossa essência de ser social continua a mesma desde quando nos estabelecemos como Espécie Animal.

Pela falta desses antigos hábitos de convivência, dessa integração familiar é muito comum vermos pessoas falando só pelas ruas, há aumento exponencial das sociopatias, do consumo de drogas, das fobias, dos transtornos obsessivos compulsivos (TOC), dos casos de autismo, de suicídio, das manias e principalmente, os casos de síndrome de pânico porque o homem, não pode viver confinado sem contato físico com outras pessoas, nem se relacionando através de aparelho telefônico móvel.