Niterói, sua linda!
 
Há muitos anos, ainda menino, lá no alto do Morro da Penha e bem à beira da “Pedreira do Vigia”, eu contemplava e observava o poente indescritível que o céu da tarde proporcionava.
Naquele exato instante, uma nuvem parecia querer esconder para si, sem êxito, os reflexos do sol que, de uma forma absolutamente fortuita, escapavam dentre ela, por frestas provocadas pelo vento, deslumbrando, mais e mais suas brilhantes e agudas manifestações de vida.
Era uma visão que me acariciava as retinas e trazia uma certeza enorme da importância daquele lugar para a minha vida.
Cumpria cada degrau daquelas escadas, seduzido pelas cafifas coloridas que por vezes flutuavam, sem destino e sem vida, pelo corte inclemente das linhas de cerol.
Num ritmo frenético, eu subia mais e mais a cada passo, sem tirar os olhos do céu, acompanhando cada uma das pipas, hipnotizado pelos seus delicados bailados, conduzidas pelo sopro do vento, numa dança diferente, tal qual borboletas flutuantes e sem rumos definidos.
Eis que de repente, as cafifas não me importavam mais. Os outros meninos corriam para todos os lados atrás daqueles diversificados brinquedos. Enrolavam linhas em suas mãos e carretilhas, como se tivessem conquistado um prêmio que os fariam para sempre, os mais hábeis, inteligentes e vencedores de qualquer tempo.
E eu que não conseguia tirar os olhos daquele pôr do sol, entendia que a cidade tinha detalhes espalhados em cada um dos seus cantos, que mais pareciam transformá-la em um ser vivo.
Ela respirava e pulsava ... eu percebia!
Os ônibus fumegantes se esgueiravam pelas ruas apertadas, dando sempre a impressão que haviam sido construídos maiores do que efetivamente deveriam ser.
A barcaça, em seus vaivéns, mostrava uma movimentação acelerada, tirando a quietude do lugar de ambiente bucólico, o que era comum em tantos outros momentos do dia.
Por alguns instantes, tinha a impressão que os carros eram engolidos, à medida que iam sumindo no longo corredor que os levava, da rua até à embarcação.
Lá de cima, percebia os gritos das gaivotas, que num frenesi incontido, disputavam as ofertas de peixes, enjeitados, que os pescadores, em seus retornos de longe, lançavam ao mar.
O campo do Vianense era um caso à parte, onde era possível observar os meninos correndo atrás de uma bola, nas peladas de fim de tarde.
As primeiras luzes da cidade eram acesas e o brilho que vinha do sol, aos poucos ia se desvanecendo, trocados pelas lâmpadas das casas e postes que se espalhavam pelas ruas.
Niterói ia se transformando numa linda senhora, só que agora, absolutamente brilhante, vaidosa e certíssima de que era absoluta.
Diante dos meus olhos, de repente, um cometa perdido rasga um céu já todo estrelado, com sua cauda de fogo, insinuante e dourada.
A noite agora era mais profunda.
Eu começava a descer o morro.
Paro durante instantes, contemplo aquela imensidão e fecho os olhos.
Num suspiro profundo, me envolvo em contentamento e, sem querer, do meu jeito de garoto, agradeço a Deus por tudo o que acabara de viver.
Diante de tanta beleza, quase que num desabafo, acabo soltando uma pequena exclamação, extasiado por estar ali, vivo e tentando construir juras de amor ...

... Niterói, sua linda!
Germano Ribeiro
Enviado por Germano Ribeiro em 29/08/2019
Reeditado em 30/08/2019
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