JÓ ANA, A NOIVA

" Não terás outros deuses além de mim." (Êxodo)

Jó Ana conheceu o seu deus Iago no colégio, aos treze anos. Foi uma revelação, uma epifania. A descoberta do amor para toda a vida. Aos dezoito, o feliz noivado. Jó Ana, embriagada de felicidade e de esperança no futuro, começou a preparar o enxoval.

O tempo passando. Aos trinta anos, o enxoval há muito tempo pronto, Jó Ana continuava "a noiva". Iago dizia que esperava a vida melhorar, o Brasil melhorar.. (talvez a paz mundial) . Jó Ana envelhecendo esperava, sem nunca perder a fé no seu deus enganador. Lentamente, Iago foi se afastando. Não falava mais em casamento. Jó Ana, a eterna dama de honra no casamento das amigas, a noiva conformada esperava.

Um dia, uma amiga, constrangida, contou que viu Iago,na fila do supermercado, com uma mulher e quatro crianças. Jó Ana questionou, pela primeira vez, o seu amado deus: " Não me escondas nada, que nada se esconde." Ele confessou : "Há dez anos, vivia com outra mulher e tinha quatro filhos, sendo dois enteados. Claro, que ele não amava a outra ,só estava com ela por causa das crianças." Jó Ana chorou, sofreu, adoeceu, emagreceu. Mas continuava amando o seu deus um sete um, acima de todas as coisas.

O tempo continuou passando. Quinzenalmente, eles se encontravam em um motel, pago por Jó Ana. Iago sempre se queixava de falta de dinheiro. Penalizada, Jó Ana, bem empregada, propôs ao seu amado deus manipulador : ela pagaria o aluguel e a escola das crianças. Oferenda feita, oferenda aceita.

O tempo passou. Na semana passada, Jó Ana morreu. Atropelada por um ônibus, atravessando uma movimentada avenida, com o sinal, ainda, aberto. Não viu. Angustiada, preocupada e distraída, estava passando uma mensagem para o seu deus menino, acamado, devido a uma virose.

Era uma vez Jó Ana, a noiva eterna e paciente.