Atravessamos os umbrais mais desafiadores, somos expulsos por contrações uterinas da tepidez materna e, em seguida, abrimos os pulmões, pela primeira vez, a respirar o parco oxigênio, desde logo sentimos a dor de existir. Choramos ,ainda sem saber, que somos a criatura de mais longa infância e portadora de indelével fragilidade. Crescemos aos tropeços e, seguimos inconscientemente a trilha de nossos antepassados. Andamos por palácios e pocilgas e, de repente, nos deparamos com a enigmática parede que servia  de divisória entre a casa grande e o porão. A parede encarna o paradoxo a divorciar o ambiente iluminado e agradável do plano lúgubre e subterrâneo.  Se, você prestar bem atenção, pode-se ouvir as lamúrias e queixumes da parede. As dores incrustadas nos tijolos, amalgamadas pela argamassa e fixadas na alma, que tanto forma a intuição como a consciência. Existem paredes que narram uma vida inteira, sem intervalos, sem edições e nem eufemismos palatáveis. A parede da senzala rodiava escravos, seres desumanizados e, séculos depois, ainda seriam perseguidos pelo racismo inexplicável. A parede do clausto que rodeia o condenado, ser despedido de dignidade e, fadado ao isolamento. Como que se animalizá-lo fosse a solução de todos os pecados humanos. O ideal era educá-lo para ser livre, para fazer as escolhas escorreitas, ou pelo menos, as lícitas.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 20/08/2019
Reeditado em 20/08/2019
Código do texto: T6724809
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