QUANDO DESARMAMOS O ESPELHO
Curioso o espelho.
Ele nos castiga, gritando o quanto de tempo nos passou e, junto disso, traz a certeza de que ainda temos estoque de vida a degustar.
O espelho mostra alguém do outro lado que se parece com a gente, mas que pouco sabemos de fato.
O que será que esse outro alguém faz quando não aparece refletido? Será que vaga por esse mundo como fantasma sem dono, aprontando mil e umas?
Essa imagem pode ser, quem sabe, o que somos de fato, enquanto nós não passamos de mísero reflexo dela, nada além disso.
O espelho esconde mistérios indevassáveis, talvez acoberte nossa alma, talvez guarde certos segredos que nunca compartilharemos com ninguém.
Ele reina incólume, só aguardando estarmos na sua frente pra mostrar sua verdadeira face.
Somente quando desencarnamos e entramos em outra dimensão é que conseguimos desarmá-lo, pois ao ficarmos diante dele nada acontece, vira um incauto placebo, totalmente inútil.
É a nossa vingança pelo quanto nos berrou, sem o mínimo vestígio de piedade, de que estávamos ficando mais velhos a cada novo segundo.