A HERANÇA...

            O Coronel Lindoso tinha três filhos e uma filha, e a vida toda tentara mantê-los por perto para ter controle sobre eles, e ao mesmo tempo ir transmitindo seus conhecimentos de fazendeiro experiente, ensinando-lhes a enfrentar os ardis da vida no campo. Vivia numa propriedade grande onde criava gado e cultivava café.  Esperava que quando partisse dessa vida, seus filhos dessem continuidade  e ampliassem  aquele  patrimônio que lutara tanto para conseguir. Porém a medida que foram completando maioridade, os filhos homens começaram a manifestar desejo de se livrarem daquele jugo opressivo do Pai.  o mais novo foi o primeiro a seguir seu rumo. Com a pequena economia que tinha, comprou parte de um garimpo de diamantes no Tejuco e foi cuidar de sua vida, sentindo-se respirar mais fácil assim que transpôs as divisas de Rancho Alegre. Os outros dois também alegando vocações diferentes partiram para São Paulo onde se estabeleceram no comércio. A filha, moça prendada, aprendera com a mãe os segredos da boa mesa e de uma boa governança doméstica, era a caçula, e nunca pensou em  ir embora. Casou-se cedo com o filho do professor da escola rural que frequentava. A princípio o velho Coronel não gostara da escolha, porém em pouco tempo o genro lhe caiu nas graças. Jovem forte, trabalhador incansável, e como se mostrava de confiança Lindoso foi aos poucos dividindo  com  ele a tarefa de administrar seu patrimônio. As notícias se espalharam rapidamente, e logo começaram a chegar manifestações dos filhos distantes, descontentes com a atenção e o tratamento que o pai dispensava ao cunhado. Tinham ficado sabendo que Cantídio  estava mandando mais na propriedade que o próprio sogro. Aquilo não estava certo, onde já se viu entregar o controle dos bens a uma pessoa que entrara na família há pouco tempo, diziam eles. O Genro tinha grande respeito pelo coronel e seguia trabalhando sem dar ouvido aos cunhados. "Porque não ficaram para ajudar o pai?" pensava ele. Tempos depois, Lindoso pensando numa maneira de pacificar e reunificar a família resolveu reservar uma parte das terras para ele e a mulher, e dividir o resto com os filhos. Preferia fazê-lo em vida pois previa grande embates depois de sua partida. Aproveitando a festa do seu octogésimo aniversário, com todos os filhos presentes anunciou que havia feito a partilha conforme sua vontade. Ficaria com  vinte por cento, destinaria quarenta por cento para a filha e o genro e os outros quarenta por cento seriam divididos entre os outros três filhos. Aproveitou para chamar os filhos de volta para trabalhar e desenvolver o que herdaram.  Estava disposto a orienta-los e ajuda-los. Nem consideraram o chamado, foi uma confusão, os ânimos se acirraram mais ainda e passaram a nem se falar. Mas foi tudo feito segundo a vontade do Coronel. Homologada a partilha e regularizados os documentos.  Em menos de dois anos, só a filha e o genro continuavam lutando e progredindo. Os outros venderam as suas partes e romperam definitivamente com o resto da família. Após o falecimento dos Pais, os que se sentiram lesados entraram na justiça para para rever e modificar a partilha. Então tiveram nova surpresa, Lindoso havia feito outro documento deixando os vinte por cento que reservara para si e sua mulher, também para a filha e o genro, como bônus por nunca terem lhe abandonado. A ação de revisão já se arrasta por mais de quinze anos, os três reclamantes já gastaram praticamente tudo que herdaram e provavelmente perderão. Pouca coisa causa mais discórdia do que dinheiro, sobretudo o que vem de mão beijada.
Al Primo
Enviado por Al Primo em 18/08/2019
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